Arquivo mensal: janeiro 2008

CIÊNCIA EXPANDIDA I

 

João Carlos Holland de Barcellos

Setembro 2007

“Se a verdade não fosse o objetivo da filosofia, os irmãos Grimm teriam sido os maiores filósofos do mundo” (jocax). 

Este ensaio propõe um novo ramo do conhecimento – A Ciência Expandida – formado com a unificação da Ciência e da Filosofia. 

Resumo: Inicialmente, neste artigo, apresentamos as bases sobre quais se assentam a Ciência atual, em seguida explicamos a principal vertente científica da ciência moderna: O “Falsificacionismo popperiano” e mostramos porque as atuais críticas a este sistema são falhas. Posteriormente provamos que o “falsificacionismo” é logicamente inconsistente e propomos um novo conceito de ciência, unificando-a com a filosofia.

 

1-Objetivo da Ciência 

A Ciência tem como meta única a verdade. Este objetivo é essencial para qualquer tentativa de conceituação em ciência.

2-Postulados básicos da Ciência 

2.1-A Compatibilidade com os Fatos 

A verdade, em ciência, pode ser definida como: “toda informação compatível com a realidade”. O termo “compatibilidade com a realidade”, nessa nossa definição de verdade, deve ser entendido como “estar de acordo com os fatos”, e nunca em contradição com eles. Dessa forma “a compatibilidade com os fatos” fornece o caráter empírico da ciência, pois atrela a verdade científica à realidade dos fatos. 

2.2-O Universo é Lógico 

Igualmente, devemos também tomar como postulado científico a de queo nosso Universo seja lógico, isto é, o Universo – definido como o conjunto de tudo o que existe – não apresenta contradições lógicas entre seus elementos e/ou suas leis e deve, portanto, obedecer à lógica clássica (aristotélica). Tal assunção é importante porque, primeiro, nunca se constatou um único caso de evento ilógico no universo. Segundo, porque se permitíssemos a contradição, a ciência seria “trivializada” isto é, toda e qualquer tipo de afirmação, por mais absurda que fosse, seria verdadeira, já que um sistema lógico com premissas incompatíveis implica, necessariamente, que toda proposição seja verdadeira. No apêndice ‘A’, no fim deste texto, provamos que a proposição “O Universo não existe” pode ser derivada logicamente de um sistema lógico que apresenta premissas contraditórias. Algumas definições usuais de ciência podem ser encontradas no Apêndice ‘B’. 

 

3-O Método Científico 

O conjunto de regras com que a ciência busca o conhecimento (informações consideradas ‘verdadeiras’ ou altamente confiáveis) é reunido no que se costuma chamar de “Método Científico”.  

3.1-“O Método Dedutivo” 

O Método dedutivo segue do postulado que o Universo é Lógico, assim as inferências lógicas podem ser aplicadas às teorias científicas para se extrair outras teorias que, por conseqüência lógica, também deverão ter o mesmo grau de confiabilidade. A base do método dedutivo é o silogismo lógico conhecido como “Modus Ponens” [8]:  

  H=>D            (Se “H” implica “D”)

  H                    (e ocorre “H”)

=> D               (Podemos Concluir que “D” também ocorrerá) 

Esta regra pode ser resumida na seguinte fórmula tautológica:  

((H => D) ^ H) => D

(Se “H” implica “D” e ocorre “H”, podemos concluir “D”). 

Como exemplo: “Se todos os gansos são brancos” e minha tia tem um ganso, posso concluir que ele é branco.  Assim, a partir da teoria geral H: “todos os gansos são brancos” podemos extrair a teoria particular D: “o ganso da minha tia é branco”.

3.2-“O Método Hipotético Dedutivo” 

Uma das mais importantes regras do método científico, “O Método Hipotético-Dedutivo” é baseada na Tautologia Lógica conhecida como “Modus Tollens” [7], que pode ser resumida na seguinte fórmula: 

((H => D) ^(~D)) => ~H 

(Se “H” implica “D” e não ocorreu “D”, podemos concluir que não ocorreu “H”).  

Que pode ser interpretada da seguinte forma: “Se ‘H’ implica em ‘D’, e ‘D’ é falso podemos concluir que ‘H’ é falso”.

Como exemplo: Se “todos os gansos são brancos” isso implica que o ganso da minha tia deve ser branco, mas, contudo, minha tia tem um ganso vermelho, posso concluir que ‘todos os gansos são brancos’ é uma teoria falsa.

Assim, para investigarmos uma teoria “H” nas condições que esta teoria implique na conseqüência “D”, se esta conseqüência não for verificada, isto é, se nas condições que H é verdadeiro a conseqüência “D” não é verdadeira, podemos concluir, logicamente, que a teoria “H” não é verdadeira (está refutada). Isto é um resultado importante porque permite que não precisemos investigar diretamente a teoria “H” basta investigarmos suas conseqüências (“D”) para concluirmos sobe “H”.  Claro que se “D” for observado não podemos concluir que “H” é correta, mas “H” sairá ‘fortalecida’ isto é, com um grau maior de confiabilidade, por ter passado no teste. 

É importante observar que a metodologia científica provém diretamente do postulado de que o Universo comporta-se logicamente. Se não fosse assim, nem o método hipotético-dedutivo nem o método-dedutivo poderiam ser justificados. 

O “Método Indutivo”, ou simplesmente Indução, já não é considerado rigorosamente como parte da metodologia científica, pois parte de eventos particulares, ou amostras, para derivar teorias gerais. Assim, não podemos nunca afirmar que o que veio de uma indução seja verdadeiro simplesmente por ter vindo de uma indução. Por exemplo: “Todos os gansos que observei na minha vida são brancos, então posso concluir que todos os gansos são brancos?” Não pode; “O Sol aparece todos os dias desde que a humanidade existe. Posso concluir que isso sempre vai ocorrer?” Também não pode. 

Apesar disso, não podemos jogar o “método indutivo” no ostracismo, pois, mesmo não sendo muito confiável, ele nos fornece pistas importantes para conectarmos nossa mente com a realidade. Nenhuma teoria científica teria sido descoberta sem a indução. O que é a observação científica, o empirismo em si, se não um método indutivo para se chegar a hipóteses de caráter geral?  

Se considerarmos o “Método Indutivo”, não como um critério de prova de teorias científicas, mas sim como um método de fornecer hipóteses ou idéias para teorias, ele pode ser considerado válido e muito precioso. Isaac Newton, por exemplo, não teria descoberto a lei da gravitação se não tivesse observado a atração da matéria. Einstein não teria criado a Relatividade Geral se não houvessem experimentos mostrando que a velocidade da luz era constante. 

4-A Origem das Teorias Científicas 

É importante observar que a ciência não faz qualquer restrição sobre a origem das hipóteses ou teorias científicas. [Vamos considerar, neste texto, hipóteses e teorias como sinônimos. Em geral, uma teoria inicia como sendo uma hipótese, e depois de vários testes, se conseguir passar incólume, recebe o ‘status’ de teoria científica. Entretanto, uma hipótese ‘novinha em folha’ pode ser verdadeira enquanto uma antiqüíssima teoria pode ser falsa (lembra da teoria que a Terra era o centro do Universo?), de modo que, com todo o rigor lógico e científico, uma teoria não é necessariamente mais válida que uma hipótese.] Novas teorias podem ser conseguidas através da indução (que é o modo mais utilizado), mas também podem ser conseguidas através da pura imaginação, ou até mesmo de sonhos [9].  Não há restrições para a criação de hipóteses. As teorias não são refutadas olhando-se suas origens, mas sim suas conseqüências.

 

5-As Pseudo-Ciências 

Não há restrições sobre a origem das hipóteses científicas. Nenhuma hipótese ou teoria pode, a priori, ser descartada apenas porque não foi produzida por indução ou por meio de observações empíricas. E, embora essa liberdade científica de criação de hipóteses possa ser enriquecedora, onde ninguém está proibido de criar novas e revolucionárias teorias científicas, por outro lado, numa terrível contrapartida, isso causa uma enxurrada de teorias e hipóteses as mais ilógicas e estapafúrdias possíveis que proclamam a si mesmas o status de teoria científica: são as famigeradas “pseudociências”. 

6-Popper e o Critério do Falseamento

Os postulados e os métodos científicos aqui descritos são adotados, se não explicitamente, ao menos implicitamente, por quase todos os cientistas e filósofos da ciência. Contudo, eles ainda não são suficientes para delimitar com exatidão o que é ou não é científico, para separar ciência de pseudociência.

Tomemos, como um exemplo ilustrativo, a “Teoria do Diabinho Verde” (TDV): “Existe sempre um ‘diabinho verde’ pairando sobre o ombro de cada pessoa, mas sempre que alguém tentar olhar para ele, ou fizer qualquer tentativa de detectá-lo ou de registrá-lo de alguma maneira, ele ficará invisível e indetectável”. Este exemplo propõe uma teoria que não contraria nenhum postulado científico, nem é intrinsecamente inconsistente, o que seria motivo suficiente para descartá-la, mas, apesar disso, estamos impossibilitados de testar esta teoria. Então, o que fazer? 

O primeiro filósofo a tentar demarcar claramente o que é ou não é ciência foi Karl Popper (28/7/1902–17/9/1994) [1]. Popper delimitou a ciência adicionando-lhe os seguintes critérios [10]: 

1-Nenhuma teoria científica pode ser provada verdadeira.

2-Uma teoria científica apenas pode ser provada falsa.

3-Uma teoria que não pode ser refutada não é uma teoria científica. 

Assim, com esse novo conjunto de postulados, Popper instituiu a ‘falseabilidade’ (ou ‘refutabilidade’) como o principal critério de distinção entre teorias científicas das não científicas. A ‘refutabilidade’ de uma teoria quer dizer que, em princípio, a teoria é passível de ser falseada e assim poder ser, ou não, refutada (Modus-Tollens seria uma da forma de refutar uma teoria).  Por exemplo, ao analisarmos o caso da nossa ‘teoria do diabinho verde’ (TDV), acima, podemos agora perceber que não se trata de uma teoria científica, já que é uma teoria que não pode ser falseada nem diretamente nem indiretamente, portanto não é refutável, e, portanto também não pode ser uma teoria científica. 

É importante reforçar a idéia de que não existe “comprovação” de uma teoria científica. Se uma teoria passa nos testes diz-se que a teoria foi corroborada pelos testes e nunca que ela foi confirmada por eles (no sentido de ter sido provada verdadeira). Quando uma teoria é corroborada ela ganha confiabilidade, apenas isso, pois pelo critério (1), acima, nenhuma teoria pode ser considerada verdadeira: 

O método da ciência é o método de conjecturas audazes e engenhosas seguidas de tentativas rigorosas de falseá-las”. Só sobrevivem as teorias mais aptas. Nunca se pode dizer licitamente que uma teoria é verdadeira, pode-se dizer com otimismo que é a melhor disponível, que é melhor que qualquer das que existiam antes. ”[3] 

A despeito da engenhosidade “popperiana” em demarcar a ciência não lhe faltaram críticas. 

 6.1- Críticas e Defesas ao ‘Falcificacionismo Popperiano’ 

A principal critica ao “falsificacionismo popperiano” é que a teoria que é testada está sempre embutida num meio ambiente cujas condições nem sempre podem ser totalmente controladas ou avaliadas. Desta forma pode-se ter um “falso negativo” em relação à sua validação, e a teoria vir a ser descartada prematuramente. Por exemplo, suponha que queiramos testar a teoria “Todos os gansos são brancos” e, para isso, tentamos refuta-la observando diversos gansos espalhados pelo mundo com binóculos, câmeras e outros apetrechos de observação. Finalmente um observador consegue filmar, ao longe, um ganso marrom voando junto ao seu bando de gansos brancos. Com esta “prova” em mãos ele consegue refutar a teoria. Mas, e se o ganso marrom estivesse apenas sujo de terra? Não estaríamos descartando prematuramente uma teoria verdadeira? 

Esta crítica ao “falsificacionismo popperiano” é válida, mas pode ser facilmente refutada com o argumento de que se a teoria foi injustamente falseada, por uma observação mal conduzida, ou até mesmo fraudulenta, esta observação, na verdade, não serviu como refutação da teoria: Uma falsa refutação não é uma refutação. Da mesma forma não podemos invalidar o sistema judiciário simplesmente por que alguém pode apresentar falsas provas para condenar ou absolver um réu. Se o exemplo refutatório for inválido, e a teoria for injustamente refutada, isso, por si só, não tira o mérito do critério falsificacionista, apenas assinala que devemos ser muito cuidadosos com os testes e, além disso, sempre se poderá tentar refutar a própria refutação. Se isso for feito, a teoria pode “renascer“ e ser reconsiderada, novamente, como uma teoria válida. Se não, deverá permanecer no limbo das teorias refutadas esperando, quem sabe num futuro, talvez nunca, uma possível contra-refutação. 

Um segundo tipo de crítica, também bastante utilizado, é que o “falsificacionismo” não segue o que a história da ciência tem mostrado, isto é, se analisarmos a evolução da ciência a partir de seu desenvolvimento histórico, não iremos encontrar a racionalidade que Popper procura impor a ela. Mas esta crítica também não faz nenhum sentido racional, pois seria o mesmo que dizer que não devemos criar remédios em laboratório porque se estudarmos a evolução humana o homem sempre sobreviveu e evoluiu sem que existissem remédios. Não é justificava racional alegar que devemos manter um determinado “modus operandi” simplesmente porque, no passado, isso sempre foi assim. Entretanto, apesar destas críticas a Popper poderem ser refutadas, há, na verdade, como veremos a seguir, uma inconsistência lógica nos critérios “popperianos”. E isso é fatal em ciência e também ao “popperianismo”. 

6.2- Refutando Popper 

Embora as críticas históricas ao “falcificacionismo” popperiano sejam elas próprias refutáveis, pois não atingem de fato a lógica do processo falsificacionista, os postulados introduzidos por Popper são, na verdade, inconsistentes. E a inconsistência interna é simplesmente fatal em ciência. Para provar isso, consideremos os dois primeiros critérios propostos por Popper para demarcar uma teoria científica: 

i) Nenhuma teoria científica pode ser provada verdadeira (confirmada).

ii) Uma teoria científica só pode ser provada falsa. 

Tomando o postulado básico que a ciência busca a verdade e não necessariamente a utilidade das teorias, mesmo porque a “utilidade” de uma teoria é uma característica subjetiva, devemos tomar o postulado (i) não como uma condição para que uma teoria seja científica, mas como uma impossibilidade de se prova-la verdadeira.  

Se interpretássemos o postulado (i) como uma condição para uma teoria ser científica, muitas teorias, que pudessem ser provadas verdadeiras, seriam consideradas anti-científicas apesar de a ciência buscar a verdade! Isso seria um completo contra-senso. Portanto, deveremos interpretar o postulado (i) não como uma condição na qual as teorias devam obedecer para serem consideradas científicas, mas sim como uma impossibilidade de termos certeza de qual é a essência última da realidade. Não podemos, por exemplo, nem mesmo provar que o solipsismo [14] seja falso: Qualquer informação que chega à nossa consciência poderia ser apenas imaginação de uma realidade que, na verdade, não existe. Alguém, por exemplo, poderia provar que não está sonhando? 

Não precisamos, contudo, chegarmos aos limites da epistemologia para entendermos por que não podemos ter absoluta certeza da veracidade de uma teoria científica: É impossível sabermos se temos, de fato, o conhecimento de todas as possíveis condições que influenciam a aplicabilidade de uma teoria. Sem explicitarmos estas condições a teoria pode não ser válida em determinados contextos onde as condições não se verificam. Por exemplo, considere a teoria “A água ferve a 100 graus Celsius”. Esta teoria é válida apenas nas condições de pressão adequada (1 ATM), caso contrário ela é falsa. Assim a teoria mais correta seria: “A água ferve a 100 graus Celsius a 1 ATM de pressão”. Mas será que agora temos todas as condições necessárias? E se a água for composta, na sua maioria, de átomos de hidrogênio pesado (deutério)? 

Vamos agora mudar o enfoque e mostrar a inconsistência dos critérios (i) e (ii): 

Consideremos a seguinte teoria: “Esta caixa de sapatos contém um sapo”.

Esta teoria pode não ser muito útil mas, por hora, não estamos preocupados com a utilidade das teorias e sim com sua veracidade. Se abrirmos a caixa de sapatos e constatarmos que ela contém um sapo o que poderemos dizer? Poderemos considerá-la verdadeira? Isso refutaria o postulado (i) de Popper?  Estas questões não são triviais uma vez que se pode alegar que o que vemos não é um sapo mas uma rã, ou então que o que estamos vendo pode ser uma ilusão de ótica ou até mesmo um sonho e, portanto, não podemos afirmar que a caixa contém um sapo e nem mesmo que a caixa existe. De fato estas alegações filosóficas podem manter o critério (i) incólume, contudo, ele entra em contradição com a regra (ii) “Uma teoria científica só pode ser provada falsa”, se não vejamos: 

Se uma teoria pode ser provada falsa então também é verdade que sua negação pode ser provada verdadeira.  

No mesmo momento que uma teoria é provada falsa, a teoria que a nega esta sendo provada verdadeira. Aqui o sentido da palavra “provar” tem a mesma conotação tanto para prová-la falsa como para prová-la verdadeira. Como ilustração, consideremos, por exemplo, a teoria A: “Todos os gansos são brancos”. Se podemos provar que esta teoria é falsa apresentando, por exemplo, um ganso vermelho estaremos, ao mesmo tempo, provando que a teoria B: “Nem todos os gansos são brancos”, é verdadeira!  

Contudo, se filosoficamente aceitamos o fato de (i) ser verdadeiro, isto é, se admitimos que não possamos ter certeza sobre a verdade última da realidade então, a rigor, também nunca poderemos dizer que uma teoria pode ser provada falsa, pois se uma teoria “T” pode ser provada falsa, a teoria oposta “Não-T”, (negação de “T”), pode ser provada verdadeira, isto é, teríamos como uma verdade absoluta a teoria “Não-T”. De qualquer modo podemos concluir que o “falsificacionismo popperiano” é intrinsecamente contraditório, e isso abre espaço para que uma nova teoria sobre ciência entre em campo.

POSTED BY SELETINOF 11:24 AM   

 

CIENCIA EXPANDIDA II

7- A “Ciência Expandida” ou “Ciência Ocaniana” 

A Ciência, assim como a filosofia, buscam a verdade. É natural então que sejam unificadas e este projeto visa redefinir a Ciência e unificá-la com a Filosofia numa área do conhecimento que chamei de “Ciência Expandida” ou “Ciência Ocaniana”. 

Sendo a meta única da “Ciência Expandida” (CE) a verdade, ela não deve se restringir às ciências empíricas embora estas também façam parte da CE. Entretanto, a verdade em CE, deve ser toda informação que seja compatível com a realidade, onde a realidade é o conjunto de fatos que aconteceram ou acontecem. Não interessa à CE proposições construídas sobre sistemas desconectados da realidade. 

Se tomarmos as palavras ‘teoria’, ‘hipótese’ ou ‘proposição’ como sinônimas, poderemos definir os seguintes critérios que definem a “Ciência Expandida”, “Ciência Ocaniana”, ou simplesmente Ciência: 

(i)-Apenas as proposições vinculadas direta ou indiretamente com a realidade são objetos de análise da Ciência Expandida. 

(ii)-As proposições que mais se adequarem à “Navalha de Ocam” deverão ser consideradas mais próximas da realidade que as demais.

Estes dois critérios formam os pilares mestres desta nova ciência. O critério (i) destina-se a separar o que faz ou não parte da ciência expandida. O critério (ii) destina-se a classificar as proposições em relação ao seu grau de veracidade, isto é, deveremos crer que as teorias melhores “ranqueadas” são as mais próximas da realidade do que as que não satisfazem ocam. 

Podemos observar que não mais existe o critério do falseamento justamente porque, a rigor, não podemos provar nada em termos de verdade absoluta (isto está implícito no critério (ii)) e, claro, nem mesmo provar que algo seja falso. Entretanto, podemos dar uma nova conotação à palavra “Prova” ou “Refutação” se a entendermos como relativas à Navalha de Ocam [11]. 

Consideremos o seguinte exemplo ilustrativo:

Encontramos uma caixa de sapatos e dentro dela observamos que há um tijolo. O que podemos dizer da teoria: “Dentro desta caixa há um tijolo”? 

Quando olhamos lá dentro e observamos um tijolo isso não seria uma prova cabal de sua verdade absoluta? Por mais incrível que possa parecer: não! Existem, na verdade, infinitas hipóteses que, em princípio, poderiam ser até verdadeiras, e que negariam a proposição de que dentro daquela caixa há um tijolo. Vejamos algumas delas: 

– O volume era, na verdade, de um rádio de pilha imitando um tijolo.

– O volume era algo que se assemelhava a um tijolo mas não era um tijolo.

– Não era um tijolo porque você esta num sonho imaginando isso.

– Um curto-circuito cerebral momentâneo fez você imaginar um tijolo numa caixa vazia.

– Uma nova arma de ondas alfa foi testada em você para que você imaginasse o tijolo.

– Alguém criou uma imagem holográfica do tijolo para que você pensasse que era real.

– Não existe tijolo pois este universo é uma imaginação de uma grande consciência.

– etc.etc. 

Assim, não poderemos provar, sem sombra de dúvidas, que qualquer afirmação sobre a realidade, por mais óbvia que possa parecer, seja, de fato, realidade. Entretanto, pelos critérios da “Ciência Ocaniana” podemos utilizar a “navalha de ocam” e dar preferência para as teorias mais plausíveis em termos da “navalha” e, dessa forma, considerarmos a proposição “A Caixa de sapatos possui um tijolo” como sendo a mais adequada delas, a mais próxima da realidade. 

É interessante observar que a “teoria do diabinho verde” (TDV), do inicio deste ensaio, que antes não podia ser abordada pela ciência popperiana, que não podia ser testada nem falseada, é agora facilmente tratável pela “ciência expandida”: A teoria do diabinho verde deve ser considerada menos verdadeira em relação à teoria de que não existe tal diabinho, já que esta última é mais adequada em termos da “navalha de ocam”. 

7.1- Algumas considerações sobre a “Navalha de Ocam” 

A “Navalha de Ocam” estabelece que não devamos colocar hipóteses desnecessárias em uma teoria. O termo “desnecessário” é a chave da navalha de ocam: Se podemos explicar um fato com menos hipóteses, então isto deve ser feito. Hipóteses extras devem ser descartadas. Se varias teorias explicam os mesmos fenômenos, devemos dar preferência para a teoria com um subconjunto menor de hipóteses. Pode-se mostrar que o acréscimo de hipóteses desnecessárias a uma teoria faz com que ela se torne menos provável de ser verdadeira [11]. Assim podemos entender a navalha de ocam como um critério de classificação de teorias mais prováveis. As teorias que mais se adequarem à navalha de ocam são as teorias mais prováveis de serem verdadeiras. 

Muitos referem-se a navalha de ocam como o critério da “simplicidade” e isto é perigoso. A “simplicidade” na navalha de ocam não se refere ao que é mais simples de entender e sim ao que é mais provável de acontecer. Por exemplo: Para alguns dizer que a vida na Terra foi patrocinada por alienígenas, pode ser muito mais fácil de entender do que através de choques aleatórios e improváveis de moléculas, mas não mais provável de acontecer já que a hipótese alienígena implicaria que se deveria também explicar a origem da vida destes alienígenas adicionada às explicações de como teriam conseguido tecnologia suficiente para chegarem a nosso planeta. Ou seja, a “simplicidade” aparente da hipótese da vida plantada na Terra por extraterrestres embute, na verdade, a complexidade da origem da vida dos extraterrestres adicionado da complexidade de uma evolução mais rápida que a nossa.  

7.2- O Papel das Evidências e a Lista Classificatória 

Podemos definir uma evidência como um fato a favor de uma teoria, como um evento que corrobora uma teoria. Claro que uma mesma evidência pode, eventualmente, corroborar também teorias rivais. Um ganso branco, por exemplo, pode corroborar a teoria “todos os gansos não são pretos” como também a teoria “todos os gansos não são vermelhos”. Quanto mais restritiva for a evidência, no sentido de não corroborar teorias rivais, menores as chances das teorias rivais serem verdadeiras e maiores as chances da teoria corroborada pela evidência ser verdadeira. Se, por exemplo, observamos um tijolo numa caixa de sapatos, este tijolo corrobora muito mais a teoria “A caixa de sapatos não está vazia” do que a teoria “A caixa de sapatos está vazia” já que as hipóteses extras necessárias para a caixa estar de fato vazia enquanto observamos um tijolo dentro dela são bastante improváveis (apesar de poderem ser verdadeiras). Note que já não existe mais uma refutação explicita das teorias que não foram corroboradas pela evidência, apenas são deslocadas para o fim da “Lista Classificatória” das teorias mais prováveis de serem verdadeiras. Entretanto poderemos ainda utilizar a palavra “refutação” ou “falseamento” se a entendermos no sentido relativo do termo, isto é, que uma teoria refutada por evidências é apenas uma teoria menos provável de ser verdadeira. 

7.3- O Papel da Lógica e da Metodologia Científica 

Todas as evidências que temos desde que nos conhecemos como espécie humana, apontam que o universo segue a lógica aristotélica. Assim, se alguma teoria, hipótese, ou proposição violar a lógica ela estará indo contra esse imenso e extraordinário “histórico de evidências”, e deve portanto ser colocada nos últimos lugares da “Lista Classificatória”. Isso equivale, na prática, a uma refutação. Entretanto, poderemos manter o termo “REFUTAR”, não no sentido absoluto da palavra – o de descartar uma teoria para sempre – mas sim o de entendê-la como altamente improvável de ser verdadeira. Devemos portanto considerar o nosso Universo lógico como a maior evidência de que dispomos, e assim poderemos continuar utilizando o Método indutivo (3.1) e o Método Hipotético Dedutivo (3.2) da mesma forma que o utilizávamos antes, com a diferença que as conclusões que chegarmos não podem ser consideradas verdades absolutas. 

7.4- A Antiga Ciência Popperiana 

O Critério popperiano (i) “Nenhuma teoria científica pode ser provada verdadeira” foi mantida e está embutida no critério (ii) da “Ciência Expandida” (CE) já que esta apenas fala de grau de proximidade em relação à realidade. O “Falsificacionismo” é claramente descartado no quesito (i) da CE uma vez que todas as proposições relativas à realidade são abordadas e não somente aquelas que podem ser falseáveis. Entretanto, as “evidências refutatórias“ popperianas ainda possuem alto grau de relevância na CE, justamente por tais evidências obrigarem as teorias a colocarem hipóteses improváveis – contrariando assim a navalha de ocam – para poderem permanecer coerentes com os fatos observados. Por exemplo: A teoria “A caixa de sapatos está vazia” precisa de alguma hipótese improvável para permanecer válida (como um ‘curto circuito’ cerebral) frente à evidência de que observamos um tijolo dentro dela. Desta forma, “evidências refutatórias” ainda são válidas para jogar a teoria refutada nos últimos lugares da lista de teorias mais próximas da realidade. 

7.5- As Religiões 

Se definirmos o Universo como o conjunto de tudo o que existe, as religiões também são objetos da CE uma vez que fazem referências a aspectos da realidade. Assim sendo, também são passíveis de classificação pela Ciência Expandida, segundo a navalha de Ocam. 

7.6- O Solipsismo 

A Idéia solipsista é a de que tudo que observamos sentimos e acreditamos não passa de uma ilusão de alguma consciência (eu) e que, portanto, esta realidade que observamos é falsa, não existe. Como o Solipsismo faz referências sobre a realidade ele é passível de análise pela Ciência Expandida:

A hipótese de que o Universo se desenvolveu a partir de umas poucas leis físicas e uma quantidade finita de partículas elementares levando-o, como conseqüência, a produzir vida inteligente com consciência, requer muito menos hipóteses (e hipóteses simples) do que as necessárias para se ter um ser de tal complexidade que fosse capaz de imaginar e relacionar cada mínimo detalhe de nosso mundo imaginário. Além disso, teríamos também que resolver o problema da origem de um ser desta complexidade [13]. Portanto, pela navalha de ocam, o solipsismo deve ser preterido em relação a um universo não imaginado ou não virtual. Ou seja, agora, e não antes, podemos cientificamente “descartar” a hipótese solipsista. 

7.7- O Nada Jocaxiano 

A hipótese de que o universo, incluindo as leis da Física, tenha sido gerado a partir do Nada-Jocaxiano (NJ) [12] (um nada sem elementos físicos e nem leis) passa a ser considerada uma hipótese científica já que refere-se à nossa realidade: a origem do nosso universo. Como o NJ é a hipótese mais simples sobre a origem do universo que respeita o Argumento de Kalam [13] (“Um tempo infinito no passado jamais poderia levar ao nosso presente, já que demoraria um tempo infinito” = nunca) ela deve ser uma das teorias mais próximas da realidade segundo a navalha de ocam. 

7.8- A Filosofia 

Como a Filosofia busca a verdade tratando de idéias e conceitos, em última instância, relacionados à realidade, ela também é parte da Ciência Expandida. 

Dessa forma propomos a unificação da Ciência e da Filosofia, nesse novo ramo do saber: A Ciência Expandida.

 

Apêndice A : Prova de que premissas contraditórias implica que qualquer conclusão seja verdadeira, até mesmo que “O Universo não existe” :

 

1)  Premissa  1 :    “A”  ( ‘A’ é verdade )

2)  Premissa  2 :   “~A” ( ‘Não A’  é verdade )

   Mas:   “A^(~A)   => FALSO“  ( ‘A e não A implica Falso’, Tautologia Lógica *)  

   Então, podemos concluir de 1 e 2  (por ‘modus ponens’) : 

3)  “Falso” ( Concluímos ‘falso’ )

   Mas: “Falso => Qualquer Coisa”  (‘Falso implica X’,  X é qualquer proposição , é  uma Tautologia  Lógica)

   Atribuindo a  ‘X’ (ou a ‘Qualquer coisa’ ) a proposição ”O Universo não existe” , Teremos:

4) “Falso => O Universo não existe”

  De 3 e 4 podemos por ‘modus ponens’ concluímos finalmente:

5) “O Universo não existe” 

O que é um absurdo.

Esse exemplo mostra que de premissas contraditórias podemos provar qualquer absurdo. 

(*Tautologia é uma verdade lógica absoluta isto é, uma verdade que independe do valor das variáveis)

 

Apêndice B: Algumas  definições de Ciência encontradas na Internet 

Ciência: 

    * Investigação racional ou estudo da natureza, direcionado à descoberta da verdade.

      Tal investigação é normalmente metódica, ou de acordo com o método científico, um processo de avaliar o conhecimento empírico;

    * O corpo organizado de conhecimento adquirido por tal pesquisa. 

A Ciência é o conhecimento ou um sistema de conhecimentos que abarca verdades gerais ou a operação de leis gerais especialmente obtidas e testadas através do método científico. O conhecimento científico depende muito da lógica.[2] 

O método científico é um conjunto de regras básicas para um cientista desenvolver uma experiência a fim de produzir conhecimento, bem como corrigir e integrar conhecimentos pré-existentes. É baseado em juntar evidências observáveis, empíricas, e mensuráveis, baseadas no uso da razão.[6]

Referências:

 

[1] Karl Popper

http://pt.wikipedia.org/wiki/Karl_Popper 

[2] Ciência

http://pt.wikipedia.org/wiki/Ciência 

[3] A Doutrina do Falseamento em Popper

http://www.cfh.ufsc.br/~wfil/popper5.htm 

[4] O Conhecimento Objetivo: Uma abordagem Evolucionária

http://minerva.ufpel.edu.br/~lhammes.unipampa/LucioHammes_files/Textos/PopperConhecimentoObjetivo.htm 

[5] Ciência e PseudoCiência 

http://minerva.ufpel.edu.br/~lhammes.unipampa/LucioHammes_files/Textos/LakatosTeriaCiencia.htm 

[6] Método Científico

http://pt.wikipedia.org/wiki/M%C3%A9todo_cient%C3%ADfico 

[7] Modus tollens

http://pt.wikipedia.org/wiki/Modus_tollens 

[8] Modus ponens

http://pt.wikipedia.org/wiki/Modus_ponens 

[9] Os misteriosos lampejos das descobertas científicas

http://www.henriqueurbanski.com.br/artigos.aspx?CON_Id=49 

[10] As Bases da Ciência

http://www.genismo.com/logicatexto1.htm 

[11] A “Navalha de Ocam”

http://www.genismo.com/logicatexto24.htm 

[12] O “Nada Jocaxiano”

http://www.genismo.com/logicatexto23.htm 

[13] O Argumento de Kalam

http://str.com.br/Atheos/kalam.htm 

[14] O Solipsismo

http://www.xr.pro.br/Exeriana/Solipsis.html

Fontepesquisada:(http://ssdi.di.fct.unl.pt/pc/files/CiExp.html)

POSTED BY SELETINOF 11:23 AM   

ORGULHO & HUMILDADE

 

Pouco conhecimento faz com que as criaturas se tornem orgulhosas. Muito conhecimento, que se tornem humildes. É assim que as espigas sem grãos erguem desdenhosamente a cabeça para o céu, enquanto que as cheias as baixam para a terra, sua mãe.

 

Leonardo da Vinci

 

POSTED BY SELETINOF 6:44 PM

 

PARADÍGMAS & PSICOLOGIA TRANSPESSOAL

 

 

Abaixo, publicamos algumas anotações contidas no orkut de Denise Franklin, (psicóloga e pos-graduada em psicologia transpessoal), nas quais esta fala-nos sobre alguns aspectos importantes da evolução do conhecimento humano, com relação ao universo e ao próprio homem, e as respectivas mudanças paradigmáticas ao longo desse processo; pondo em evidência, claro, o papel da ciência da psicologia transpessoal nesse estudo.

 

Paradigma Newtoniano-Cartesiano:

– É o que se impõe às nossas percepções no estado de vigília (mais comum)
– O Universo é visto como um "mecanismo de relógio", com seus componentes separados.

– Espaço e tempo são percebidos como entidades separadas. O tempo é linear (passado, presente e futuro).
– O observador (ou experimentador) não influencia a realidade dos acontecimentos com o seu pensamento e expectativas ("mito da neutralidade científica").

 

Teoria da Relatividade (matéria x energia):

Na "Teoria da Relatividade" de Einstein, através da clássica fórmula: E=m.c² (energia é igual à massa vezes a velocidade da luz ao quadrado) constata-se que energia se transforma continuamente em matéria e que o contrário também é verdadeiro. Em outras palavras, a matéria não passa de uma forma condensada de energia. Da mesma forma, os elétrons às vezes se comportam como partículas e, às vezes, como ondas. Além disso, existem inúmeros níveis passando da energia mais sutilizada à matéria mais densa.

 

Paradigma Quântico:

– É o que se impõe às nossas percepções durante os estados alterados de consciência (sonhos, meditação e outros). Suas leis são claramente observadas no mundo subatômico.
– O Universo é visto como uma "teia de aranha" onde todas as suas partes estão intrinsecamente interrelacionadas. Se mexermos nun único fio dessa "teia", todo o restante será alterado (ou influenciado).
– Espaço e tempo são percebidos como uma única entidade e são circulares.
– O observador influencia a realidade dos acontecimentos com o seu pensamento. Cai por terra o "mito da neutralidade científica". Nos experimentos realizados onde foram observados os movimentos dos elétrons, constatou-se que essas partículas subatômicas se comportam de acordo com o pensamento e expectativas do observador.

 

Universo Holográfico:

O microcosmo contém as mesmas características do macrocosmo. Ex: Cada célula reproduz os mecanismos do organismo pluricelular como um todo.

 

Conclusões éticas advindas da mudança de Paradigma:

– Cada um de nós constrói a realidade de sua vida a partir de seus pensamentos e crenças.

– Todos são responsáveis pelo que acontece a qualquer momento e em qualquer lugar (não confundir responsabilidade com culpa). 

 

Psicologia Transpessoal e mudança de Paradigma:

A Psicologia Transpessoal, que trabalha com os estados alterados de consciência (sonhos, meditação e outros), desenvolveu seus postulados teóricos e científicos, basicamente a partir da teoria Junguiana (sincronicidade, arquétipos, inconsciente coletivo) e do advento da Física Quântica.

Mas apesar das inúmeras comprovações no âmbito da física quântica, continua a ser encarada com desconfiança nos meios acadêmicos mais conservadores. E não é para menos, com tanto charlatanismo e falta de seriedade que dominam, especialmente, o campo fértil das chamadas "terapias alternativas". Entretanto, é preciso estudo sério e conhecimento profundo para saber "separar o joio do trigo". E não, de uma forma cômoda e fácil, descartar sumariamente tudo que não se encaixa no pré-estabelecido.

A ciência, atualmente, está começando a introduzir o conhecimento intuitivo e criativo (não objetivo) nas suas fronteiras antes tão rigidamente demarcadas e dominadas, única e exclusivamente, pelo cognitivo e racional.

Na medicina, psicologia e em todas as áreas do conhecimento humano, a idéia da necessidade de conceber o ser humano holisticamente para que resultados efetivos sejam alcançados, está cada vez mais presente. Não é dissecando e separando mas procurando trabalhar o indivíduo como um todo harmônico (físico, mental e espiritual) que se pode alcançar um equilíbrio e saúde satisfatórios em todos os níveis que interagem e se interdependem de forma muito estreita.

Assim como a emoção, a afetividade, a intuição, a criatividade e outras capacidades humanas, a necessidade e a busca pelo transcendental é inerente à sua natureza e, por isso, devem também ser trabalhadas terapêuticamente. Mesmo sendo negada pelos mais racionais e materialistas. Até porque, a rigidez que leva ao fanatismo (apego excessivo a dogmas e preceitos pregados, quer pelos que se dizem adeptos dessa ou daquela "religião", quer pela sociedade como um todo, grupos sociais, instituições ou seja o que for) gera sofrimentos profundos e necessita ser trabalhada na busca de um maior equilíbrio e flexibilidade.

 

Fontepesquisada:(http://www.orkut.com/Scrapbook.aspx?uid=4963651054234665059&pageSize=&na=3&nst=-2&nid=4963651054234665059-1196432975-4963651054234665059)

 

POSTED BY SELETINOF 11:30 AM   

PROCESSO DE INDIVIDUAÇÃO

Fig 14 - Nise da Silveira e C. G. Jung.tif

Aqui, texto de Nise da Silveira, retirado de seu livro JUNG Vida e Obra.

(Acrescentamos trechos de outros autores apenas para contextualizar mais nossa postagem)

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Todo ser tende a realizar o que existe nele em germe, a crescer, a completar-se. Assim é para a semente vegetal e para o embrião do animal. Assim é para o homem, quanto ao corpo e quanto à psique. Mas no homem, embora o desenvolvimento de suas potencialidades seja impulsionado por forças instintivas inconscientes, adquira caráter peculiar: o homem é capaz de tomar consciência e desenvolvimento e de influenciá-lo. Precisamente no confronto do inconsciente pelo consciente, no conflito como na colaboração entre ambos é que os diversos componentes da personalidade amadurecem e unem-se numa síntese, na realização de um indivíduo específico e inteiro. Essa confrontação “é o velho jogo do martelo e da bigorna: entre os dois, o homem, como o ferro, é forjado num todo indestrutível, num indivíduo. Isto, em termos toscos, é o que eu entendo por processo de individuação ” (Jung). 

O processo de individuação é descrito em imagens nos contos de fada, mitos, no opus alquímico, nos sonhos, nas diferentes produções do inconsciente. Sobretudo através dos sonhos será possível acompanhá-lo ao vivo nos progressos, interrupções, regressões e interferências várias que perturbem seu desenvolvimento. Seguindo-o em numerosíssimos casos, Jung verificou a constante emergência de imagens análogas ou semelhantes que se sucediam, traçando, por assim dizer, o itinerário do caminho perorrido. Baseado nessas observações, Jung descreveu as principais etapas do processo de individuação.

A preliminar será o desvestimento das falsas roupagens da persona.

Para estabelecer contactos com o mundo exterior, para adaptar-se às exigências do meio onde vive, o homem assume uma aparência que geralmente não corresponde ao seu modo de ser autêntico. Apresenta-se mais como os outros esperam que ele seja ou ele desejaria ser, do que realmente como é. A esta aparência artificial, Jung chama persona, designação muito adequada, pois os antigos empregavam esse nome para denominar a máscara que o ator usava segundo o papel que ia representar. O professor, o médico, o militar, por exemplo, de ordinário mantém uma fachada de acordo com as convenções coletivas, quer no vestir, no falar ou nos gestos. Os moldes da persona são recortes tirados da psique coletiva.

Se, numa certa medida, a persona representa um sistema útil de defesa, poderá suceder que seja tão excessivamente valorizada a ponto do ego consciente identificar-se com ela. O indivíduo funde-se então aos seus cargos e títulos, ficando reduzido a uma impermeável casca de revestimento. Por dentro não passa de lamentável farrapo, que facilmente será estraçalhado se soprarem lufadas fortes vindas do inconsciente.

VERDADEIRAMENTE IMORAL É TER DESISTIDO DE SI MESMO

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Até cortar os defeitos pode ser perigoso – nunca se sabe qual o defeito que sustenta nosso edifício inteiro…há certos momentos em que o primeiro dever a realizar é em relação a si mesmo…. Do momento em que me resignei, perdi toda a vivacidade e todo interesse pelas coisas. …Para me adaptar ao que era inadaptável, para vencer minhas repulsas e meus sonhos, tive que cortar meus grilhões – cortei em mim a forma que poderia fazer mal aos outros e a mim. E com isso cortei também a minha força… Ouça: respeite mesmo o que é ruim em você – respeite sobretudo o que imagina que é ruim em você – não copie uma pessoa ideal, copie você mesma – é esse seu único meio de viver…Pegue para você o que lhe pertence, e o que lhe pertence é tudo o que sua vida exige. Parece uma vida amoral. Mas o que é verdadeiramente imoral é ter desistido de si mesma.

______Crarice LISPECTOR______

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Nenhum exemplo ilustrará melhor o que seja a persona, que o conto de Machado de AssisO Espelho.

Neste conto, Machado apresenta a teoria de que o homem tem duas almas: “uma que olha de dentro para fora, outra que olha de fora para dentro”. (…) “Há casos, por exemplo, em que um simples botão de camisa é a alma exterior de uma pessoa; e assim também a polca, o voltarete, um livro, u’a máquina, um par de botas, uma cavatina, um tambor, etc.” E narra o caso de um jovem que, sendo nomeado alferes da guarda nacional, tanto se identificou com a patente que “o alferes eliminou o homem”. Quando, por circunstâncias especiais, ele foi obrigado a ficar sozinho numa casa de campo onde não havia ninguém para prestar as louvações e marcas de respeito devidas ao alferes, sentiu-se completamente vazio. Até sua imagem no espelho, ele via esfumada, sem contorno nítido. Este fenômeno estranho levou-o ao pânico. Desesperado, lembrou-se de vestir a farda de alferes. “O vidro reproduziu então a figura integral, nenhuma linha menos, nenhum contorno diverso; era eu mesmo, o alferes, que achava, enfim, a alma exterior”.

Quanto mais a persona aderir à pele do ator, tanto mais dolorosa será a operação psicológica para despí-la.

Quando é retirada a máscara que o ator usa nas suas relações com o mundo, aparece uma face desconhecida. Olhar-se em espelho, que reflita cruamente esta face, é decerto ato de coragem. Será visto nosso lado escuro onde moram todas as coisas que nos desagradam em nós, ou mesmo que nos assustam. É nossa sombra. Os primitivos acreditavam que a sombra projetada por seus corpos, ou sua imagem refletida n’água, fosse uma parte viva deles próprios. E, com efeito, a sombra (em sentido psicológico) faz parte da personalidade total. As coisas que não aceitamos em nós, que nos repugnam, e por isso as reprimimos, nós as projetamos sobre o outro, seja ele o nosso vizinho, o nosso inimigo político, ou uma figura símbolo como o demônio. E assim permanecemos inconscientes de que as abrigamos dentro de nós. Lançar luz sobre os recantos escuros tem como resultado o alargamento da consciência. Já não é o outro quem está sempre errado. Descobrimos que frentemente “a trave” está em nosso próprio olho.

Quanto mais a sombra fôr reprimida mais se torna espessa e negra. Exemplo impressionante deste fenômeno da dinâmica psíquica encontra-se no conto de R. Stevenson, Dr. Jekyll e Mr. Hyde, que o cinema divulgou num filme intitulado O Médico e o Monstro. Dr. Jekyll era um médico admirado pela sua capacidade, afável com os amigos e cheio de bondade para seus doentes. Mr. Hyde, um ser moralmente insensível, sempre pronto a cometer crimes. O dois eram a mesma pessoa.

É muito curioso que o conto de Stevenson tenha tido origem num sonho do autor e logo haja sido escrito, quase sem pausas, em três dias. Trata-se de um extraordinário documento psicológico. Jekyll descreve-se: “meu maior defeito era uma certa disposição natural para o prazer, disposição que fez a felicidade de muitos outros, mas que eu achava difícil de conciliar com o meu imperioso desejo de andar de cabeça erguida. Usava então diante do público de uma aparência mais grave que o comum”. – Ele se surpreendia de ver que, sob a forma de Hyde, não lhe contentavam os prazeres que Jekyll não se permitia. Hyde, como personagem autônomo, livre de seguir seus impulsos, ia muito além, revelava-se intrinsicamente mau, capaz de todas as vilezas.

cruz

IMCOMPLETUDE HUMANA

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O fato da contradição interna aponta para a impossibilidade da completude humana, incompletude que aparece no mito de Narciso quando Ovídio faz Tirésias afirmar “Narciso morrerá no dia em que conhecer a si mesmo”, isto é, quando conhecer aquilo que desconhece, sua incompletude, que é quando Narciso conhece o “estranho” nele mesmo e mergulha na morte.

“Através do símbolo da negação, o pensamento se livra das limitações da repressão e se enriquece de conteúdos de que não pode prescindir para o seu funcionamento” (Freud, A Negativa).

Quer dizer: para que o pensamento se enriqueça de novos conteúdos, é conveniente admitir a existência de algo, negando-o. “Eu não penso que…” Negando que existe o que existe pra poder falar dele. O difícil é se “livrar das limitações da repressão”, o que exige um ato de coragem. É possível enriquecer o debate aceitando negativamente o contrário: “Olha, não queria dizer que isso é ridículo, mas…” A convivência com aquilo que é somente positivo pouco enriquece. O negativo agrega conhecimento: “Você agora vai pensar que eu quero dizer algo ofensivo, mas não tenho de fato essa intenção”. Precisamos do contrário a nosso favor. O contrário é irritante, o contrário critica, aborrece, e é nisso ele é útil. “Vamos escutar o que o contrário tem a dizer”. A positividade vai apenas concordar com o que está sendo feito. Ou porque não percebe algo errado, ou porque percebe, mas sendo amigo e não querendo ofender, vai ficar em silêncio. Nesse aspecto, o contrário é ótimo. A positividade é, em geral, falsa. Fica por conta da negatividade a função de trazer alguma novidade. “Eu não queria dizer nada disso, mas não poderia ficar calado”. Perigo: vai reabrir a ferida narcísica.

 __________Adelmo Marcos Rossi‎_________

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A sombra é uma espessa massa de componentes diversos, aglomerado desde pequenas fraquezas, aspectos imaturos ou inferiores, complexos reprimidos, até forças verdadeiramente maléficas, negrumes assutadores. Mas também na sombra poderão ser discernidos traços positivos: qualidades valiosas que não se desenvolveram devido a condições externas desfavoráveis ou porque o indivíduo não dispôs de energia suficiente para levá-las adinate, quando isso exigisse ultrapassar convenções vulgares.

A sombra coincide com o inconsciente freudiano e com o inconsciente pessoal jungueano. Nos sonhos costuma aparecer personificada em indivíduos do mesmo sexo do sonhador, que representam, por assim dizer, o seu avesso. É um duro problema de início de análise o reconhecimento de figurantes do sonho, julgados desprezíveis pelo sonhador, como aspectos sombrios de sua prórpia personalidade.

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Mas a sombra ultrapassa os limites do pessoal e alonga-se na sombra coletiva. Veremos então homens civilizados, quando reunidos em massa, portarem-se segundo padrões os mais inferiores. Caírem presas de preconceitos coletivos de discriminação raciais. Fabricarem bodes-expiatórios. Tornarem-se ávidos, destrutivos, sanguinários. Os exemplos são múltiplos e infelizmente estão de tal modo presentes no mundo contemporâneo que será desnecessários citá-los.

Depois de travar conhecimento com a prórpia sombra, uma tarefa muito difícil se apresenta. É a confrontação da anima.

Todos sabem que no corpo de cada homem existe uma minoria de gens femininos que foram sobrepujados pela maioria de gens masculinos. A feminilidade inconsciente no homem, Jung denomina anima. “A anima é, presumivelmente, a representação psíquica da minoria de gens femininos presentes no corpo do homem” (Jung). Esta feminilidade inconsciente no homem, indiferenciada, inferior, manifesta-se, na vida ordinária, por despropositadas mudanças de humor e caprichos.

Vêm compor a anima também as experiências fundamentais que o homem teve com a mulher através dos milênios, “um aglomerado hereditário inconsciente de origem muito longínqua, tipo de todas as experiências da linha ancestral em relação ao ente feminino, resíduo de todas as impressões fornecidas pela mulher” (Jung). A anima  encerra os atributos fascinantes do “eterno feminino” noutras palavras, é o arquétipo do feminino.

O primeiro receptáculo da anima é a mãe, e isso faz que aos olhos do filho ela pareça dotada de algo mágico. Depois a anima será transferida para a estrela de cinema, a cantora de rádio e, sobretudo, para a mulher com quem o homem se relacione amorosamente, provocando os complicados enredamentos do amor e as decepções causadas pela impossibilidade do objeto real corresponder plenamente à imagem oriunda do inconsciente. Aliás essa transferência nem sempre se processa de modo satisfatório. A retirada da imagem da anima de seu primeiro receptáculo constitue uma etapa muito importante na evolução psíquica do homem. Se não se realiza, a anima é transposta, sob a forma da imagem da mãe, para a namorada, a espôsa ou a amante. O homem esperará que a mulher amada assuma o papel protetor de mãe, o que o leva a modos de comportamento e a exigências pueris gravemente perturbadoras das relações entre os dois.

Na primeira metade da vida a anima projeta-se de preferência no exterior, sobre seres reais, estando sempre presente nas problemáticas do amor, suas ilusões e desilusões. Mas, na segunda metade da existência, quando o jogo dessas projeções vai se esgotando, é a mulher dentro do homem, durante anos reprimida (proque no consenso coletivo um homem nunca deve permitir que o sentimento influa na sua conduta), quem penetra na sua vida sem ser chamada. O “homem forte” estará então freqüentemente amuado, tornar-se-à hipersusceptível, surgirão intempestivas mudanças de humor, explosões emocionais, caprichos. Ele perderá progresivamente o comando em sua casa.

A anima apresenta-se personificada, nos sonhos, nos contos de fada, no folclore de todos os povos, nos mitos, nas produções artísticas. As formas, belas ou horríveis, de que se reveste são numerosíssimas: seria, mãe-d’água, feiticeira, fada, ninfa, animal, súculo, deusa, mulher. O princípio feminino no homem poderá desenvolver-se, diferenciar-se, transpor estágios evolutivos.

Eis um exemplo de anima correspondente à etapa em que fortes componentes sexuais acham-se mesclados a elementos românticos e estéticos. Fala, em linguagem enfática, a jovem tocadora de cinor pintada na parede de um túmulo pagão, lugar de refúgio do monge Pafnucio quando se debatia no seu doido amor por Thais: “Para onde pensas me fugir, insensato? Tu encontrarás a minha imagem no desabrochar das flôres e no donaire das palmeiras, no vôo das pombas, nos saltos das gazelas, na fuga ondulosa dos regatos, nas dormentes claridades da lua. E, se fechares os olhos, a encontrarás em ti mesmo. (…) Conheces-me bem, Pafnucio. Por que não me reconheceste? Sou uma das inúmeras encarnações de Thais. (…) Decerto ouviste dizer que Thais viveu outrora em Esparta sob o nome de Helena. Em Tebas Hecatompila, ela teve uma outra existência. Donde vem tua surpresa? Era certo que, fôsses aonde fôsses, encontrarias Thais”. (THAIS – Anatole France, tradução brasileira de Sodré Viana).

crusificada

VONTADE DE POTÊNCIA

Ensaio de uma transmutação de todos os valores

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“Sem a fé cristã”, diz Pascal, “seríeis, em face de vós mesmos, assim como a natureza e a história, um monstro e um caos.” Essa profecia cumprimo-la: depois que o século dezoito, débil e otimista, adornou e racionalizou o homem.

Schopenhauer e Pascal… Num sentido essencial, Schopenhauer é o primeiro que retoma o movimento de Pascal: um monstro e um caos, portanto algo que é preciso negar… a história, a natureza, o próprio homem!

“Nossa incapacidade em conhecer a verdade é consequência de nossa corrupção, de nossa decomposição moral”, – é assim que Pascal fala. E Schopenhauer diz, no fundo, a mesma coisa. “Quando mais profunda é a corrupção da razão, mais necessária é a doutrina da graça” – ou, para falar a língua de Schopenhauer, negação.

______Friedrich Nietzsche_______

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Exemplo de anima representativa de estágio evolutivo superior, misteriosa encarnação de espiritualidade e sabedoria, é Mona Lisa. Dmitri Merejkowski, no livro O ROMANCE DE LEONARDO DA VINCI (tradução de Breno da Silveira) teve a intuição perfeita de que a Mona Lisa era a própria alma do pintor, quando pôs na boca de um de seus discípulos, estas palavras: “a realidade parecia um sonho e o sonho, realidade, como se Mona Lisa não fosse uma criatura viva, esposa de um cidadão florentino, um certo Messer Giocondo, o mais comum dos mortais, mas um ser semelhante aos espíritos e evocado pela vontede do mestre – uma fada, sósia feminino do próprio Leonardo”.

Se o princípio feminino no homem (anima) for atentamente yomado em consideração e confrontado pelo ego, os fenômenos decorrentes de seus movimentos autônomos dissolvem-se, suas personificações desfazem-se. A anima torna-se uma função psicológica da mais alta importância. Função de relacionamento com o mundo interior, na qualidade de intermediária entre consciente e inconsciente, função de relacionamento com o mundo do exterior na qualidade de sentimento conscientemente aceito.

Do mesmo modo que o corpo de todo homem existe uma minoria de gens femininos, no corpo de cada mulher acha-se presente uma minoria de gens masculinos. Jung denomina animus à masculinidade existente no psiquismo da mulher. Esta masculinidade é inconsciente e manifesta-se, de ordinário, como intelectualidade mal diferenciada e simplista. Daí vermos freqüentemente mulheres sustentarem afirmações a priori, opiniões convencionais, que não resistem ao exame lógico mas que nem por isso deixam de ser teimosamente defendidas com argumentos acirrados. O animus opõe-se à própria essência da natureza feminina que busca, antes de tudo, relacionamento afetivo. Sua hipertrofia resultará em humor querelante, em quebra de laços de amor.

O animus condensa todas as experiências que a mulher vivenciou nos seus encontros com o homem no curso dos milênios. E é a partir desse imenso material inconsciente que é modelada a imagem do homem que a mulher procura.

O primeiro receptáculo do animus será o pai. Transfere-se depois para o mestre, para o ator de cinema, o campeão esportivo ou o leader político. Projetado sobre o homem amado, faz dele uma imagem ideal, impossível de resistir à convivência cotidiana. Vêm as decepções inevitáveis.

jungnietzsche

JUNG – NIETZSCHE

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Fazendo um paralelo entre o conceito principal da Psicologia Analítica, denominado Processo de Individuação, e o livro que é considerado a obra prima do filósofo Friedrich Nietzsche “Assim falou Zaratustra”:

Zaratustra, prólogo do livro, dirige-se ao vale ao encontro dos Homens, com o intuito de levar-lhes o seu “fogo”; a sua proposta da “Transvaloração dos Valores”. Para tanto, Zaratustra torna-se o porta voz de idéias, que de acordo com Nietzsche, seriam fundamentais para o futuro do homem. Dentro desta perspectiva, idéias como a morte de Deus, o Übermensch ou o Superhomem, a vontade de potência e o eterno retorno, ao terem as suas ações combinadas, dariam à conhecer a ruína, que de acordo com Nietzsche, foi produzida pela hipocrisia que caracteriza a cultura moderna.

De acordo com essa perspectiva, o conceito de Übermensch só pode ser apreendido antagonicamente a tudo o que representa o homem moderno, pois ele representa os esforços que deverão ser feitos pelo homem para que este possa criar algo para além de si, referindo-se à busca do homem por sua singularidade e diferenciação dos valores culturais e coletivos.

À esta questão Jung responderá com o que denominou de “individuação”. Assim como Nietzsche, Jung compreendia a individuação, como a possibilidade de diferenciação, de criação, uma oportunidade dada ao homem para encontrar significado na vida. Embora a individuação possa significar ter que assumir grandes responsabilidades e perigos, ainda assim Jung considerava-a um caminho para a cura e a completude:

“o desenvolvimento da personalidade […] é uma questão de dizer sim a si mesmo, de se considerar como a mais importante das tarefas, de ser consciente de tudo o que se faz, mantendo-o constantemente diante dos olhos em todos seus dúbios aspectos” (JUNG apud CLARKE, 1999, p. 199).

Conceito central na psicologia analítica, a individuação busca a realização do “vir-a-ser” do homem, cujo objetivo final é a integração criativa e funcional dos diversos aspectos da psique, visando ao desenvolvimento de sua totalidade. O conceito vem demonstrar a importância conferida por Jung à necessidade do indivíduo atingir a sua autorrealização, por meio do cultivo de uma relação deliberada, consciente com aquilo que de mais profundo existe dentro dele. Pois a individuação, em geral, é o processo de formação e particularização do ser individual e, em especial, é o desenvolvimento do indivíduo como ser distinto do conjunto, da psicologia coletiva. É, portanto, um processo de diferenciação que objetiva o desenvolvimento da personalidade individual (JUNG,1991/a,§ 853).

Da mesma forma como foi proposto por Nietzsche no Zaratustra que o homem busque a realização de si mesmo, a questão da individuação para Jung consistia na busca da realização do Self, o que significava a realização consciente e plena do potencial que se encontra presente em todo indivíduo. Segundo Jung, o Self deverá ser entendido como “um jogo de luz e sombra, ainda que seja entendido como totalidade e, por isso, como unidade em que se unem os opostos” (JUNG,1991/a,§ 902)….

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Posted by Rogério Fonteles Castro

O UNIVERSO É UM COMPUTADOR?

         

Tudo o que conhecemos não passa do processamento de uma imensa máquina que cospe a realidade. Pelo menos é o que diz o cientista Seth Lloyd.  

Desta vez não é nem um astrofísico nem um cosmólogo quem se aventura a explicar a origem do Universo. É um especialista em computadores: Seth Lloyd, professor de Engenharia Mecânica do Massachusetts Institute of Technology (MIT), um dos maiores centros mundiais de pesquisa científica. Ele afirma que todo o cosmo, da galáxia em espiral na foto acima às moléculas de poeira na ponta da chuteira do Ronaldinho, faz parte de – acredite – um gigantesco e complexo computador.

Esse processador descomunal é alimentado, segundo Lloyd, por cada pequeno evento físico, em qualquer quebrada obscura do Universo, desde o início dos tempos há 13,7 bilhões de anos. E o que essa máquina cósmica cospe como resultado final é a própria realidade. Não se trata de uma comparação ou metáfora. Lloyd não afirma que o Universo "se parece com" ou "funciona como" um computador. Para ele, o Universo "é" um computador. 

Claro que Lloyd não se refere a um computador tradicional, feito com chips de silício e impulsos elétricos. Trata-se de uma máquina que explora algumas singularidades das partículas fundamentais que constituem a matéria e, por isso, é conhecida como computador quântico. O próprio Lloyd é um especialista nesse tipo nascente de computação. Foi ao pesquisar a física básica necessária para montar essas máquinas que ele esboçou sua teoria, descrita em seu livro Programming the Universe (Programando o Universo), recém-lançado nos Estados Unidos.  

 

FUTURO Estudantes australianos observam aparelho de pesquisas. Nenhum laboratório conseguiu ainda obter um protótipo de computador quântico.   

Suas idéias lembram o filme Matrix. O mundo que vemos, segundo o filme, é apenas um ambiente virtual montado por computadores, uma imensa máquina que nos ilude o tempo todo. Só agimos dentro desse mundo virtual porque estamos plugados a ele. Na versão do cinema, porém, o mundo real existe. E acordamos para ele quando tiramos os plugues. A versão de Lloyd é bem mais radical. "No Matrix, o que você vê é falso, é uma simulação. Mas nosso Universo é uma simulação tão exata que é indistinguível do real", afirma Lloyd. "Átomos e moléculas são bits. A linguagem da máquina são as leis da física."  

         

 

A idéia radical de Lloyd não está amparada por nenhuma evidência científica. Mas ajuda a desvendar um dos maiores mistérios da física: por que o tempo flui apenas em um único sentido, rumo à maior entropia, termo criado pelo físico alemão Rudolf Clausius para definir a quantidade de informação – ou complexidade – de um sistema.

 

 

LUZ Pesquisadora russa em Novosibirsk produz cristais que podem ser usados na produção de computadores quânticos.

 

Para explicar essa idéia, pense em um baralho. As cartas vêm da fábrica organizadas. Com duas informações, o naipe e a hierarquia da carta, é possível achar qualquer uma no baralho. Mas, se as cartas forem embaralhadas, o sistema ganha desordem e complexidade. Para encontrar uma carta, será preciso examinar uma a uma. Agora, elas estão em uma seqüência específica entre 1.068 possibilidades, portanto há muito mais informação no baralho. Pois, segundo Lloyd, é isso que acontece no Universo quando uma fruta apodrece na terra e suas moléculas, antes ordenadas, se embaralham no solo. Lloyd afirma que todas as novas informações fornecidas pela podridão da fruta são equivalentes ao fluxo de dados que alimenta o colossal computador chamado Universo. Como esse computador sempre processa dados, o Universo sempre terá mais informação, portanto o tempo anda para a frente. 

Para Lloyd, apenas um computador quântico seria capaz de processar as incertezas da dinâmica no Universo. Os computadores comuns processam a informação na forma de dígitos binários, conhecidos como bits. Os resultados são previsíveis, pois 1 bit pode valer "0" ou "1". Só que, enquanto um computador tradicional fornece apenas respostas do tipo "sim" ou "não", uma máquina quântica poderia oferecer as diferentes probabilidades de que um resultado seja "sim" ou "não". Essa incerteza, de acordo com Lloyd, está mais próxima do comportamento das partículas subatômicas que fazem o Universo. 

Vários laboratórios do mundo estão pesquisando como construir computadores desse tipo. Teoricamente, eles podem multiplicar o poder de cálculo das máquinas. No jargão da computação quântica, em vez de 1 bit, o processamento seria feito por meio de unidades chamadas qubits, que podem carregar mais de uma informação. Feitos com partículas fundamentais da matéria, os qubits poderiam ser usados em mais de um cálculo ao mesmo tempo. Um computador com 2 qubits poderia, por exemplo, rodar quatro operações simultâneas. Com 1.000 qubits, um processador quântico poderia fazer mais cálculos do que o número de partículas no Universo.       

   

PROCESSADORES quânticos podem ser o único jeito de continuar miniaturizando os computadores.

 

Apesar do potencial, nenhum laboratório conseguiu produzir ainda um protótipo de computador quântico. Uma das dificuldades é isolar partículas que possam funcionar como qubits. Uma equipe da Universidade de Oxford, na Inglaterra, conseguiu manter um único qubit durante 500 bilionésimos de segundo, tempo insuficiente para realizar qualquer operação matemática. Agora, os pesquisadores tentam segurar o átomo mais tempo. Cientistas da Hitachi, em Cambridge, na Inglaterra, foram mais longe. Fabricaram um tipo de circuito em que elétrons se comportam como qubits. "É possível fazer isso usando processos tradicionais de fabricação de chips", afirma David Williams, coordenador do estudo. Mas ele ainda não conseguiu nada que possa rodar um programa.  

As tentativas mais ousadas para chegar ao computador quântico usam materiais mais inovadores. Vários pesquisadores apostam em um tipo de matéria descoberto há apenas dez anos, chamado condensado de Bose-Einstein. As pesquisas ainda estão em estágio inicial, mas devem ser vitais para o futuro da indústria eletrônica dentro de 15 anos. No ritmo atual de miniaturização, os fabricantes de chips terão de fazê-los com outro material. O caminho natural parece apontar para as partículas quânticas. E um dia pode-se chegar, se as teorias de Seth Lloyd tiverem algum sentido, até à criação de universos artificiais como o do filme Matrix.

 

Fontepesquisada:(http://revistaepoca.globo.com/Revista/Epoca/0,,EDG74141-6014,00.html)

 

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WAVE: TOM JOBIM & TOQUINHO

  

POSTED BY SELETINOF 8:37 AM 

 

A GALÁXIA DE GUTENBERG I

  “A civilização que traslada o bárbaro ou homem tribal do universo do ouvido para o da vista está agora em dificuldades com o mundo eletrônico”

No texto abaixo, retirado da orelha do livro A Galáxia de Gutenberg, Anísio Teixeira faz uma ótima prévia sobre esta obra:

Mcluhan neste livro estuda a cultura manuscrita na Antiguidade e na Idade Média e daí parte para a análise e a interpretação da cultura da pa´gina impressa, da cultura tipográfica, mostrando-nos até que ponto transformou ela a cultura oral anterior. É essa cultura que entra novamente em mudança no princípio do século XX. Mcluhan estuda então a cultura da era eletrônica e o renascimento das formas orais da civilização. Trata-se de um livro sem paralelo na literatura atual e indispensável à compreensão da transformação caleidoscópica que ora se opera em nossa visão do mundo, em nosso modo de pensar, de sentir e de agir dentro da cena tumultuada da cultura e da vida conteporânea. Impossível resumi-lo, mas cabe acentuar que o livro, além de nos permitir acompanhar a reconstrução da cultura desde o aparecimento do alfabeto e compreender a imensa transição ocorrida com a introdução da imprensa, do jornal e do livro, dá-nos também a visão da reconfiguração da galáxia de Gutenberg com os novos meios de comunicação de nossa era eletrônica. A tudo isto, junta-se a forma nova de apresentar a evolução cultural do mundo, mediante a apresentação dos fatos em configurações sucessivas sob a forma de mosaicos no curso dos acontecimentos. Desse modo, o livro é um exemplo e uma ilustração do próprio sentido da nova e imensa transição que estamos vivendo.

Como afirmou acima Teixeira, impossível é resumir este livro de McLuhan. Isto porque o autor, na elaboração de sua obra, segue caminhos vários que ora se entrelação, ora se dispersão. Parece mesmo impôr, propositadamente,  uma estrututa não linear ao seu trabalho. Assim, ao longo da exposição de Luiz Beltrão, postada em letras pretas, faremos alguns acréscimos retirados da própria obra de McLuhan, postando-os na cor vermelha: faremos isso, mesmo que de forma quase arbitrária, no sentido de dotar o texto com mais detalhes sobre o assunto.


Luiz Beltrão…

Qual será o caminho certo na defesa da cultura, da moral e dos valores humanos em nossa era eletrônica? Manter a fidelidade à cultura livresca contra os novos meios de comunicação? Continuarmos submissos aos valores literários e à forma tipográfica de expressão, dentro dos padrões críticos tradicionais, ou aplicá-los com realismo ao estudo da realidade dos “mass media” eletrônicos?

McLuhan, até então um obscuro professor de literatura inglêsa na Universidade de Toronto, colocou essas alternativas na ordem-do-dia, quando, em 1962, publicou o seu “The Gutenberg Galaxy: The Making of Typographic Man”, no qual discutiu as mudanças operadas nos meios de comunicação da atualidade, considerando-as como – esquina da História. As idéias de McLuhan não provocam tantos debates na Europa como nos Estados Unidos, talvez devido ao fato de que há poucas versões dos seus livros, conhecendo-se, apenas, excertos e conceitos básicos. Pelo menos em espanhol e português, não nos consta tradução seja da “Galáxia” (único que conhecemos no original e de que nos ocuparemos neste artigo), (temos em nossa biblioteca um volume em português da Companhia Editora Nacional, São Paulo, publicação de 1972), seja de “Understanding Media”, ou “The Medis is the Message”.

 

“A assimilação e interiorização da tecnologia do alfabeto fonético traslada o homem do mundo mágico da audição para o mundo neutro da visão” 

 

O próprio McLuhan considera que, quando escreveu “Mechanical Bride”, antes de “Galáxia”, estava tentando defender a cultura livresca contra os novos meios de comunicação, obcecado pelos valores literários apenas. As suas obras posteriores visaram “uma inspecção maior da modernidade tecnológica, que pretende alcançar a transformação total do homem e do meio” e, em conseqüência, uma “defesa de valores humanos”. Através da tática de colocar o dedo na ferida, isto é, localizar essa defesa “na consciência analítica da natureza do processo criativo que envolve o conhecimento humano”.

Artigo publicado na revista Comunicações & Problemas, 3:8-9 (1968): 5-23. Marshall McLuhan. The Gutenberg Galaxy: the making of typographic man. Toronto, Canadá, the University of Toronto Press, 1962.

Anuário Unesco/Metodista de Comunicação Regional, Ano 10 n.10, 59-64, jan/dez. 2006

Negado por uns, para os quais depois de resistir às seduções da “Noiva Mecânica” (a tipografia) deixou-se apaixonar pelas “perversidades da sua progênie eletrônica”, esquecendo a moral em favor da técnica, a sua obra, contudo, é reconhecida por outros como a de um realista, um autêntico filósofo da nova era, um restaurador até da verdadeira cultura que a revolução tipográfica liquidara.

Ao leitor, pretendemos que retire as suas conclusões, no resumo sistemático que a seguir tentaremos das teorias expostas na “Galáxia”.    

 

MEDIA E EVOLUÇÃO

 

O  homem  hoje  em dia desenvolveu  para  tudo  que  costumava fazer com o   próprio     corpo,  extensões ou prolongamentos desse mesmo corpo. A evolução de suas armas começa pelos dentes e punhos e termina com a bomba atômica. Indumentária e casas são extensões dos mecanismos biológicos de controle da temperatura do corpo. A mobilia substitui o accocorar-se e sentar-se no chão. Instrumentos mecânicos, lentes, televisão, telefones e livros que levam a voz através do tempo e o espaço constituem exemplos de extensões materias. Dinheiro é meio de estender os benefícios e de armazenar trabalho. Nosso sistema de transportes faz agora o que costumávamos fazer com os pés e as costas. De fato, podemos tratar de todas as coisas materiais feitas pelo homem como extensões ou prolongamentos do que ele fazia com o corpo ou com alguma parte especializada do corpo.

Essa exteriorização ou expressão de nossos sentidos, que é a linguagem e a fala, é um instrumento – o instrumento que “tornou possível ao homem acumular experiência e conhecimento de forma a ser fácil a sua transmissão e o máximo uso possível”.

Pelas extensões ou prolongamentos, dos nossos sentidos, seja, a roda, o alfabeto ou o rádio, tivemos que pagar certo preço; e o preço está em que tais extensões maciças dos sentido constituem sistemas fechados. Nossos sentidos corpóreos ou privados não são sistemas fechados, mas se traduzem inifindavelmente um no outro nessa experiência que denominamos consciência. Mas, nossas extensões dos sentidos – instrumentos e tecnologias – foram, através dos séculos, sitemas fechados, incapazes de se entrelaçarem numa ação recíproca ou de produzirem um estado de consciência coletivo. Agora na idade da eletricidade, a própria instantaneidade da coexistência entre nossos instrumentos tecnológicos deu lugar a crise sem precedente na história humana. As extensões de nossas faculdades e sentidos passaram a constituir um campo único de experiência que exige se fazer coletivamente consciente. Nossas tecnologias, à semelhança de nossos sentidos particulares, exigem agora um instercurso e mútuo relacionamento que torne possível sua co-existência racional. Enquanto nossas tecnologias foram tão lentas quanto a roda ou o alfabeto ou o dinheiro, o fato de se terem constituído sistemas separados e fechados foi, social e psiquicamente, suportável. Já isto não se pode dar agora, quando a visão, o som e o movimento são em toda extensão simultâneos e globais. Um proporção de adequado intercurso entre essas extensões de nossas funções humanas é agora tão necessária coletivamente quanto sempre foi para nossa racionalidade particular e pessoal o intercurso dos sentidos para nosso senso individual ou “espírito”, como outrora o denominávamos. 

A tese de McLuhan é a de que as mudanças nas interrelações humanas e na estrutura social que delas se origina foram e vêm sendo promovidas e precipitadas pela evolução dos meios de comunicação. Achamo-nos, agora, diante de uma transformação tão radical como a que se registrou na idade paleolítica para a neolítica. Estamos passando da era mecânica para a era eletrônica; de um tempo em que os instrumentos que usávamos prolongavam as nossas capacidades físicas (“as rodas são um prolongamento de nossos pés”) para uma época em que os meios eletrônicos constituem um prolongamento do nosso sistema nervoso central.

Assim, as invenções do alfabeto fonético, da imprensa e dos meios de comunicação audiovisuais eletromagnéticos marcam, cada uma, a passagem do homem de um mundo a outro.

  

 

   

 

Abrindo a discussão com uma citação de Shakespeare, McLuhan considera o “Rei Lear” como “uma miniatura do processo de desnudação, pelo qual os homens se transferiam de um mundo de papéis para o mundo das funções”. Na historia poética do “Rei Lear”, surge, pela primeira vez, em manifestação verbal, a “angustia da terceira dimensão”. Quando uma forma de expressão, um meio comunicativo, é interiorizado, verifica-se uma alteração das relações entre os nossos sentidos e, em conseqüência, mudam os processos mentais. Foi o que aconteceu quando o alfabeto fonético transferiu o homem do “mundo mágico do ouvido” para o “mundo neutro da visão”. A alfabetização afetou o homem bárbaro ou tribal tanto fisiológica como psiquicamente; a civilização deu-lhe “um ôlho por um ouvido e está agora em disputa com o mundo eletrônico”. Essa luta é conseqüência da ampliação de um dos nossos sentidos – a visão, através da TV que, para êle, é o melhor exemplo da comunicação total e instantânea, pois não há intervalo entre a circulação do fato, da idéia ou da situação e sua absorção.

 

A REVOLUÇÃO DA ESCRITA

 

Até agora os historiadores do desenvolvimento  da cultura têm  tido a tendência  de isolar os eventos tecnológicos, muito à maneira pela qual os físicos clássicos tratavam os eventos físicos. A revolução na física, empresta muita importância a essa limitação inerente ao método cartesiano ou newtoniano, os quais tanto se aproximam dos processos dos historiadores que adotam um ponto de vista individual:

Fiéis ao ideal cartesiano, os físicos clássicos motravam-nos o universo como semelhando imenso mecanismo que se podia descrever com perfeita precisão por meio da localização de suas partes no espaço e de dsuas modificações no decorrer do tempo. (…) Tal concepção, no entanto, apoiava-se em várias hipóteses implícitas que eram admitidas quase sem delas termos consciência. Uma das hipóteses era que a estrutura de espaço e tempo na qual procuramos quase institivamente localizar todas as nossas sensações é uma estrutura perfeitamente rígida e fixa, na qual, em princípio, se pode rigorosamente localizar cada evento físico, independentemente de todos os processos dinâmicos que o envolvem e circundam.

As concepções não só de Descartes como de Euclides são instituídas pelo alfabeto fonético. E a revolução, que de Broglie descreve, deriva não do alfabeto, porém do telégrafo e do rádio. J. Z. Young, biólogo, salienta esse mesmo ponto de Broglie. Depois de explicar que a eletricidade não é uma coisa que “flui”, uma “corrente”, porém a “condição, a situação que observmos quando existem certas relações espaciais entre coisas”, prossegue:

Algo semelhante aconteceu quando os físicos descobriram meios de medir distâncias muito curtas. Verificou-se não ser mais possível usar o antigo modelo, pelo qual se supunha consistir a operação em dividir-se alguma coisa chamada matéria em uma série de fatias ou pequenos pedaços, cada um com propriedades definidas denominadas tamanho, peso, ou posição. Os físicos não dizem agora que a matéria “é feita” de corpos chamados átomos, prótons, elétrons, etc. O que fizeram foi renuniar ao método materialista de descrever suas observações em termos de algo feito como que por um processo humano de fabricação, como um bolo, por exemplo. A palavra átomo ou elétron não é usada como sendo o nome de uma peça. É empregada como parte da descrição das observações dos físicos. Não tem significado, exceto quando empregada por pessoas que conhecem os experimentos pelos quais aquelas observações se revelam.

E, acrescenta ele, “é importante compreender que grandes mudanças nos modos ordinários de falar e agir do homem estão ligadas à adoção de novos instrumentos”. 

Quando o homem inventou a escrita já introduziu um fator restritivo no seu modo de conhecer e ser: até então, a disseminação das idéias era feita oralmente e a vida se desenrolava sob o influxo da palavra, da experiência e da percepção sensorial. “O alfabeto – escreve – é o agressivo militante absorvidor de culturas, conforme Harold Innis foi o primeiro a mostrar”. Sem a interiorização da tecnologia do alfabeto, as aparências visuais não podem interessar a um povo. Daí porque sociedades não alfabetizadas não podem ver filmes ou fotografias sem muito treino e porque os africanos não aceitam o nosso papel de consumidores passivos perante os filmes.

Recorrendo à história antiga, McLuhan afirma que os gregos somente promoveram a inovação artística e científica depois que interiorizaram o alfabeto, partindo para uma “ênfase visual”, que os alienou da arte primitiva. O mesmo está acontecendo agora, quando a idade eletrônica reforjou o primitivismo, depois de “interiorizar o campo unificado da simultaneidade elétrica”.

 

“A física moderna não só abandona o espaço visual e especializado de Descartes e Newton, como volta a entrar no espaço auditivo e sutil do mundo não-alfabetizado”

 

Mas apenas uma fração da história da alfabetização foi tipográfica. A escrita não conseguiria quebrar o poder da oralidade, porquanto somente os romanos e, muitos séculos depois, nos fins da Idade Média, introduziram-se técnicas de uniformização e reprodução. Assim mesmo, à falta de uma interiorização global da técnica manuscrita, tanto na Antiguidade como nos tempos medievais, “ler era necessariamente ler em voz alta”. E mais: “a cultura manuscrita é coloquial, ainda que somente pelo fato de o escritor e sua audiência estarem fisicamente ligados pela forma de publicação como desempenho (…). A cela medieval para a leitura dos monges era, na realidade, uma tenda para cantar”.

A escola era “cantada” e nela “a gramática servia, acima de tudo, para estabelecer fidelidade oral”, pois “o estudante medieval tinha de ser paleógrafo, revisor e editor dos autores que lia. “A ascensão dos escolásticos ou moderno,no século XII, provoca um rompimento definitivo com os antigos da sabedoria tradicional cristã (…). O método escolástico, como o de Sêneca, era parente direto das tradições orais do aprendizado por aforismos”.

Entretanto, o aumento na quantidade do movimento de informação favoreceu a organização visual do saber e do aparecimento, primeiro da perspectiva e depois da tipografia. “ A cultura amanuense e a arquitetura gótica preocupavam-se ambas com a luz ATRAVÉS e não SÔBRE (…). As iluminuras, comentários e esculturas medievais eram igualmente aspecto da arte da memória, centros de cultura amanuense”.

Mas o mundo medieval termina “num delírio de conhecimento aplicado a recriação da antiguidade (…). A Itália da Renascença tornou-se uma espécie de coleção hollywoodeana de tomadas da antiguidade” e o nôvo antiquarismo visual abria nôvo caminho intelectual e político para os homens de tôdas as classes, que viria com a revolução tipográfica.

   

TIPOGRAFIA E MUDANÇA SOCIAL

 

Há um trabalho recente que parece libertar-me do pecado de mera excentricidade e novidade no presente estudo. É The Open Society and its Enemies (A sociedade aberta e seus inimigos), de Karl Popper, um trabalho dedicado ao estudo de aspectos de destribalização no mundo antigo e de retribalização no mundo moderno. Com efeito, a “sociedade aberta” resultou da alfabetização fonética e está agora ameaçada de erradicação pelos meios de comunicação elétricos. Desnecessário dizer que o “está”, ao invés de o “deve” de todos esses desenvolvimentos, é só o que está aqui sendo discutido. O diagnóstico e a descrição devem preceder a valorização e a terapia. Substituir diagnóstico por valorização moral ´processo bastante natural e comum, mas não necessariamente proveitoso.

Segundo Popper, as sociedades tribais, ou fechadas, têm uma como que uma unidade biológica, enquanto “nossas sociedades abertas funcionam, em grande parte, por meio de relações abtratas, tais como troca ou cooperação”. Que esse relacionamento, pelo qual se abrem as sociedades fechadas, é obra do alfabeto fonético, e não de qualquer outra forma de escrita ou tecnologia. Por outro lado, o fato de serem as sociedades fechadas o produto de tecnologias da fala, ou linguagem oral, do tambor e da audição, prenuncia, neste início da idade eletrônica, o englobamento da família humana inteira numa só tribo mundial. E essa revolução eletrônica é apenas um pouco menos perturbadora e desconcertante para os homens das sociedades abertas do que o fôra a revolução da alfabetização fonética para as antigas sociedades tribais ou fechadas, por essa mesma revolução transformadas e remodeladas em suas atuais linhas aerodinâmicas. Popper não apresenta nenhuma análise das causas de tal mudança, mas faz uma descrição da situação que é muito pertinente a A Galáxia de Gutenberg.

A invenção da tipografia confirma e amplia a nova ênfase visual do conhecimento aplicado, ensejando o primeiro utensílio uniformemente reproduzido. Era, portanto, uma forma de comunicação ainda mais restritiva e unidimensional: os livros tornaram-se pràticamente o único meio pelo qual o saber era adquirido ou armazenado; os impressos periódicos, o meio através o qual as comunicações sofriam contrôle.

O processo tecnológico tipográfico era visual, linear e fragmentário: as seqüências formavam o padrão – uma letra após a outra, uma a palavra após a outra, um período após o outro.

Anuário Unesco/Metodista de Comunicação Regional, Ano 10 n.10, 59-64, jan/dez. 2006

Foram essas características que estabeleceram “a primeira linha-de-montagem, e a primeira produção em massa”. Ao contrário da cultura amanuense, que não podia ter publico e cujo comércio de segunda mão, tal qual o atual intercâmbio de livros raros. Um ponto de vista fixo tornou-se possível com a imprensa e aniquila a imagem como organismo plástico. O mesmo vai acontecer com a câmara escura, cujas experiências iniciais são devidas a Leonardo da Vinci2 e que, com a sua magia, “antecipa Hollywood, transformando o espetáculo do mundo exterior num utensílio ou embalagem para o consumidor”.

“Pedro Ramus e John Dewey, ambos como educadores, estiveram, como surfistas, na crista da onda produzida pelo choque de dois períodos antitéticos: o de Gutenberg e o de Marconi ou eletrônico”  

 

Católico, McLuhan introduz, nesta altura do seu estudo, uma consideração de caráter psicológico-religioso: “a ênfase visual do final da Idade Média turvou a piedade litúrgica, da mesma forma que a pressão do mundo eletrônico, hoje em dia, a purificou”. (Esse aspecto, que a “Galáxia de Gutenberg” ocupa umas três páginas, é analisado por ÉTIENNE GILSON, em ensaio filosófico, no qual considera que, em todas as ordens, vemos as obras de arte captadas por fôrças mecânicas capazes de multiplicar indefinidamente as imagens e, sob esta forma, colocá-las indiretamente à disposição das massas. Também às religiões antigas se reclamam formas modernas de liturgia. Daí pergunta-se o filósofo francês se é crível que o culto cristão conserve, no século XX, as formas que teria nos tempo de São Paulo. E tenta responder a essa interrogação pelo estudo detido do que denomina as liturgias de massa3.

 

“A nova interdependência eletrônica recria o mundo à imagem de uma aldeia global”

 

Se a mesma religião sofre o processo de adaptação à homogeneidade e ao mecanismo introduzidos pela tipografia, as demais instituições e atividades sociais ainda estão mais expostas pelo seu anti-dogmatismo às mudanças expostas pelas novas tecnologias. Na educação, Pedro Ramus “cavalga a crista da onda no período antético de Gutenberg, como John Dewey a irá cavalgar, no de Marconi, ou seja, no da eletrônica”. Rabelais oferece uma visão do futuro e da cultura da imprensa como sendo “o paraíso do consumidor de conhecimentos aplicados” e a própria tipografia, “como primeira mecanização de um oficio manual, é em si mesma um exemplo perfeito não de um oficio manual, é em si mesma um exemplo perfeito não de um novo conhecimento, mas de um conhecimento aplicado.”

Enquanto “na Renascença o conhecimento aplicado precisou assumir a forma de translação do auditivo em termos visuais, da forma plástica para a da retina”, a tipografia transforma a linguagem de um meio de percepção e exploração em um utensílio portátil; não somente uma tecnologia, mas em si mesma uma riqueza natural ou produto, como algodão, madeira ou raduim. Em conseqüência, “como qualquer produto, modela não apenas relações sensíveis e particulares, mas também os padrões de interdependência comunal”.

As conseqüências apontadas em seguida por McLuhan do advento e império da tipografia vão desde o trauma da separação ente a cabeça e o coração. “que afeta a Europa de Maquiavel até o presente” até o nacionalismo moderno.

Fontepesquisada:(http://www2.metodista.br/unesco/luizbeltrao/luizbeltrao.htm); (McLUAN, M. A Galáxia de Gutenberg. São Paulo: Companhia Editorial Nacional, 1967).  

Continua:(http://petroleo1961.spaces.live.com/blog/cns!7C400FA4789CE339!1049.entry)

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