Arquivo mensal: outubro 2011

STEPHEN HAWKING: FÍSICA NÃO DEIXA ESPAÇO PARA DEUS

PSIQUÊ

PSIQUÊ E EROS

Psiquê (em grego: Ψυχή, Psychē) é uma personagem da mitologia grega, personificação da alma.

Seu mito é narrado no livro O Asno de Ouro de Apuleio, que a cita como uma bela mortal por quem Eros, o deus do amor, se apaixonou. Tão bela que despertou a fúria de Afrodite, deusa da beleza e do amor, mãe de Eros – pois os homens deixavam de frequentar seus templos para adorar uma simples mortal.

A deusa mandou seu filho atingir Psiquê com suas flechas, fazendo-a se apaixonar pelo ser mais monstruoso existente. Mas, ao contrário do esperado, Eros acaba se apaixonando pela moça – acredita-se que tenha sido espetado acidentalmente por uma de suas próprias setas.

Com o próprio deus do Amor apaixonado por ela, suas setas não foram lançadas para ninguém. O tempo passava, Psiquê não gostara de ninguém, e nenhum de seus admiradores tornara-se seu pretendente.

 AS IRMÃS DE PSIQUÊ

O rei, pai de Psiquê, cujo nome é desconhecido, preocupado com o fato de já ter casado duas de suas filhas, que nem de longe eram belas como Psiquê, quis saber a razão pela qual esta não conseguia encontrar um noivo. Consulta então o Oráculo de Apolo, que prevê, induzido por Eros (Cupido), ser o destino de sua filha casar com um ente monstruoso.

PSIQUÊ SENDO RESGATADA POR EROS

Após muito pranto, mas sem ousar contrariar a vontade de Apolo, a jovem Psiquê foi levada ao alto de um rochedo e deixada à própria sorte, até adormecer e ser conduzida pelo vento Zéfiro a um palácio magnifico, que daquele dia em diante seria seu.

Lá chegando a linda princesa não encontrou ninguém, mas tudo era suntuoso e, quando sentiu fome, um lauto banquete estava servido. À noite, uma voz suave a chamava e, levada por ela, conheceu as delícias do Amor, nas mãos do próprio deus do amor…

Os dias se passavam, e ela não se entediava, tantos prazeres tinha: acreditava estar casada com um monstro, pois Eros não lhe aparecia e, quando estavam juntos, ficava invisível. Ele não podia revelar sua identidade pois, assim, sua mãe descobriria que não cumprira suas ordens – e apesar disto, Psiquê amava o esposo, que a fizera prometer-lhe jamais tentaria descobrir seu rosto.

Passado um tempo, a bela jovem sentiu saudade de suas irmãs e, implorando ao marido que permitisse que elas fossem trazidas a seu encontro. Eros resistiu e, ante sua insistência, advertiu-a para a alma invejosa das mulheres.

As duas irmãs foram, enfim, levadas. A princípio mostraram-se apiedadas do triste destino da sua irmã, mas vendo-a feliz, num palácio muito maior e mais luxuoso que o delas, foram sendo tomadas pela inveja. Constataram, então, que a irmã nunca tinha visto a face do marido. Disseram ter ouvido falar que ela havia se casado com uma monstruosa serpente que a estava alimentando para depois devorá-la, então sugeriram-lhe que, à noite, quando este adormecesse, tomasse de uma lâmpada e uma faca: com uma iluminaria o seu rosto; com a outra, se fosse mesmo um monstro, o mataria.

Psiquê resistiu os conselhos das imãs o quanto pôde, mas o efeito das palavras e a curiosidade da jovem tornaram-se fortes. Pôs em execução o plano que elas lhe haviam dito: Após perceber que seu marido entregara-se ao sono, levantou-se tomando uma lâmpada e uma faca, e dirigiu a luz ao rosto de seu esposo, com intenção de matá-lo.

A jovem, espantada e admirada com a beleza de seu marido, desastradamente deixa pingar uma gota de azeite quente sobre o ombro dele. Eros acorda – o lugar onde caiu o óleo fervente de imediato se transforma numa chaga: o Amor está ferido.

Percebendo que fora traído, Eros enlouquece, e foge, gritando repetidamente: O amor não sobrevive sem confiança!

Psiquê fica sozinha, e desesperada com seu erro, no imenso palácio. Precisa reconquistar o Amor perdido.

Eros voa pela janela e Psiquê tenta segui-lo, cai da janela e fica desmaiada no chão. Então o castelo desaparece. Psiquê volta para a casa dos pais, onde reencontra as irmãs que fingem piedade para com a irmã. Acreditam que o lindo Eros, solteiro, as aceitaria e seguem em direção ao belo palácio. Chamam por Zéfiro e, acreditando estar seguras pelo mordomo invisível, se jogam e caem no precipício.

Psiquê caminha noite e dia, sem repouso nem alimentação. Avista um belo templo no cume de uma montanha e acreditando encontrar seu amor escalou a montanha. Ao chegar no topo depara-se com montões de trigo, espigas de milho, cevada e ferramentas, todas misturadas e ela os separa e organiza. O templo pertencia a deusa Ceres (Deméter), grata pelo favor da bela moça lhe diz o que fazer para reconquistar o marido. Primeiro ela precisaria conseguir o perdão da sogra.

A BUSCA PELO AMOR 

Psiquê vaga pelo mundo, desesperada, até que resolve consultar-se num templo de Vênus. A deusa, já cientificada de que fora enganada, e mantendo Eros sob seus cuidados, decide impor à pobre alma uma série de tarefas, esperando que delas nunca se desincumbisse, ou que tanto se desgastasse que perdesse a beleza…

OS QUATRO TRABALHOS DE PSIQUÊ

OS GRÃOS: A princesa foi colocada num quarto onde uma montanha de grãos de diversos tipos tinha sido misturada. Psiquê devia separá-los, conforme cada espécie, no espaço de uma noite. A jovem começou a trabalhar, mas, mal fizera alguns montículos e adormece extenuada. Durante seu sono, surgem milhares de formigas que, grão a grão, os separam do monte e os reúnem consoante sua categoria. Ao acordar, Psiquê constata que a tarefa fora cumprida dentro do prazo.

A LÃ DE OURO: Vênus pediu, então, que a moça lhe trouxesse a lã de ouro do velocino de ouro. Após longa jornada, Psiquê encontra os ferozes animais, que não deixavam que deles se aproximassem. Uma voz surge de juncos num rio e a aconselha: ela deve procurar um espinheiro, junto a onde os carneiros vão beber, e nas pontas dos espículos recolher toda a lã que ficara presa. Cumprindo o ditame, Psiquê realiza a tarefa, enfurecendo a deusa.

ÁGUA DA NASCENTE: Vênus então lhe pede um pouco da suja água da nascente do Rio [[Estige]. Mas a nova tarefa logo se revela impossível: o Estige nascia de uma alta montanha tão íngreme, que era impossível escalar. Levando um frasco numa das mãos, a princesa queda-se ante a escarpa que se erguia à sua frente, quando as águias de Zeus surgem, tomando-lhe o frasco, voam com ela até o alto, enchendo-o. O trabalho, mais uma vez, foi realizado.

BELEZA DE PERSÉFONE: Vênus percebeu que teria de usar de meios mais poderosos. Inventando que tinha perdido um pouco de sua beleza por cuidar do ferimento de Eros, pede a Psiquê que, no Reino dos Mortos (o País de Hades, também chamado de Campos Elísios ou Érebo), pedisse à sua rainha, [Perséfone], um pouco de sua beleza. A deusa estava certa de que ela não voltaria viva. Mais uma vez, Vênus se engana. Psiquê convece Perséfone a encher uma caixa com sua beleza para Vênus. Psiquê está indo de volta a Vênus, quando pensa que sua beleza havia se desgastado depois de tantos trabalhos, não resiste e resolve abrir a caixa. Cai em sono profundo, Eros já curado de sua queimadura vai ao socorro de sua amada, põe de volta o conteúdo para a caixa, desperta Psiquê e ordena-lhe que entregue a caixa à mãe dele.

Enquanto Psiquê entrega a caixa a Vênus, Eros (Cupido) vai a Zeus (Júpiter) e suplica que advogue em sua causa. Zeus concede esse pedido e posteriormente consegue a concordância de Afrodite (Vênus). Hermes (Mercúrio) leva Psiquê à Assembleia celestial e ela é tornada imortal. Finalmente, Psiquê ficou unida a Eros e mais tarde tiveram uma filha, cujo nome foi Prazer.

Em grego “psiquê” significa tanto “borboleta” como “alma”. Uma alegoria a imortalidade da alma, como a borboleta que depois de uma vida rastejante como lagarta, flutua na brisa do dia e torna-se um belo aspecto da primavera. É considerada a alma humana purificada pelos sofrimentos e preparada para gozar a pura e verdadeira felicidade.

Fontepesquisada:<http://pt.wikipedia.org/wiki/Psiqu%C3%AA>

POSTED BY SELETINOF AT  10:31 PM

INTERPRETAÇÃO CRÍTICA DA TEORIA DE CAMPO LEWINIANA A PARTIR DA FENOMENOLOGIA

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teoria de Kurt Lewin, um dos primeiros psicólogos a estudarem as organizações, explica que os padrões de comportamento são decorrentes das interações e das influências que o indivíduo estabelece com o meio. Essa teoria explica como cada indivíduo sintetiza de forma difente as vivências com o meio ao longo de sua vida; assim, cada pessoa, cada ser humano, possui uma dinâmica interna própria, portanto, interpreta e percebe as coisas, as pessoas, as situações de forma particular.

comportamento é resultado de uma totalidade de fatos e eventos coexistentes em uma determinada situação. A inter-relação entre os fatos e eventos criam um campo dinâmico. Este campo dinâmico, ou ambiente psicológico, corresponde aos padrões organizados de comportamentos e percepções do indivíduo em relação a si e ao seu ambiente. (Chiavenato, 1998).

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Por Paulo Eduardo Rodrigues Alves Evangelista

Psicólogo e mestre em filosofia pela PUC-SP, professor de psicologia da UNIP. EVANGELISTA, Paulo. “Interpretação crítica da Teoria de Campo Lewiniana a partir da Fenomenologia.”

Resumo: O artigo discute os pressupostos da teoria de campo de Lewin, com vistas a apontar a objetificação do ser humano neles latente. Para isso, parte da fenomenologia, que preconiza a descrição dos fenômenos tal como aparecem a partir de si mesmos. Por fim, sugere que compreensão dos fenômenos que surgem nas dinâmicas grupais prescinde da teoria de campo.

Palavras-chave: Teoria Gestáltica, Fenomenologia, Teoria de Campo.

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Há algum tempo tenho participado de discussões com um grupo formado por terapeutas fenomenológicos sobre a possibilidade de uma abordagem estritamente fenomenológica de coordenação de grupos. Foi grande a surpresa ao constatar a escassez de material publicado nessa área. À exceção do monumental Psicoterapia de Grupo de Yalom (2006), as coordenações de grupo recorrem às diversas linhas teóricas da psicologia, mas não à fenomenologia. A fenomenologia pode ser caracterizada como uma disciplina filosófica voltada para a descrição dos fenômenos tais como aparecem. Iniciada por Husserl no começo do século XX, seu lema é “de volta às coisas mesmas!”, que significa um esforço de se ater aos fenômenos sem recorrer a modelos especulativos que os expliquem. Tomando a fenomenologia como um contraponto, neste trabalho exponho os pressupostos da teoria de campo, que fundamentam a abordagem gestáltica de coordenação de grupos, a fim de considerar se é a abordagem mais adequada para a compreensão das inter-relações pessoais observadas nas dinâmicas de grupo.

A Gestalt é a abordagem psicológica que faz uso da teoria de campos. Historicamente, a Gestalt e a Fenomenologia mantêm proximidades. Tanto Husserl, iniciador da fenomenologia, quanto Lewin, psicólogo influenciado pela Escola da Gestalt, declaram a influência da obra dos filósofos Brentano e Stumpf (Garcia-Roza, 1972). Brentano é responsável pelo conceito de intencionalidade, por qual toda consciência é consciência de algo e vice-versa. Stumpf foi aluno de Brentano e prosseguiu os estudos do seu mestre. Partindo do conceito de intencionalidade, a fenomenologia afirma a correlação entre sujeito e objeto, entre homem e mundo, não existindo um sem o outro. Essa mesma concepção está presente no conceito de “espaço vital” de Lewin, que se refere à “totalidade dos fatos que determinam o comportamento do indivíduo num certo momento” (Garcia-Roza, 1972, p.45), incluindo pessoa e meio. O ‘meio’ ao qual se refere a teoria de campo é o ‘meio fenomenológico’, isto é,  o ambiente tal como experimentado pela pessoa, em contraposição ao espaço geográfico ou objetivo. Não há um significado em si do meio. Seu significado é dado a partir da percepção que a pessoa tem dele.

Embora Gestalt e fenomenologia se aproximem num primeiro momento, a aplicação da teoria de campos na interpretação dos fenômenos observados torna-se um divisor de águas. Na abordagem gestáltica de grupos, a fenomenologia é um método de descrição do fenômeno: “o método fenomenológico consiste numa descrição sistemática da experiência imediata visando à apreensão de sua estrutura essencial.” (Garcia-Roza, 1972, p.44) Essa descrição é uma maneira de assegurar que a visão do fenômeno está livre de  pressupostos que não lhe pertencem. O momento seguinte à descrição fenomenológica é o de  aplicação da teoria de campos com a finalidade de explicar os processos dinâmicos operantes não diretamente observáveis no fenômeno. Para Lewin, não basta a descrição: “A função da descrição fenomenológica não é a de substituir uma explicação dos processos dinâmico-causais, mas proceder a uma descrição pré-teórica visando a superação dos preconceitos decorrentes de uma abordagem metafísica dos fenômenos psicológicos.” (Garcia-Roza, 1972, p.48)  Portanto, parte-se da descrição do fenômeno para, em seguida, explicá-lo. Para as ciências, a explicação tem um valor maior do que as descrições.

Descrever ou explicar os fenômenos?  

 Uma das contribuições do filósofo Dilthey, cujo pensamento contribuiu para a fenomenologia, é a distinção hoje tão comum entre ciências explicativas e ciências descritivas. Para ele, as leis da natureza são conhecíveis apenas indiretamente. Por exemplo, a lei da gravidade não é observável, mas induzida a partir da queda de corpos. É uma hipótese que explica por que corpos caem. Assim, as ciências naturais são ciências explicativas. Por outro lado, a vida psíquica é acessível diretamente. Cada qual tem acesso direto às suas vivências. Não há necessidade de inferências. A vida psíquica – e  com isso Dilthey abre para as ciências humanas em geral – precisa ser descrita. Diz ele: “Não existe um conjunto coerente da natureza nas ciências físicas e naturais senão graças aos raciocínios que completam os dados da experiência graças a uma combinação de hipóteses; nas ciências morais, ao contrário, o conjunto da vida psíquica constitui por toda parte um dado primitivo fundamental. Nós explicamos a natureza, compreendemos a vida psíquica.” (Dilthey apud Dartigues, 1992, p.12) Essa distinção está presente na fenomenologia de Husserl.

Uma teoria é uma tentativa de explicar fenômenos observados. Mas teoria também é um conjunto de pressupostos que determina um âmbito de objetos e um método de acesso a eles. Isso significa que a teoria determina previamente o que e como pode ser o objeto com o qual ela lida. A teoria de campos circunscreve um âmbito de fenomênico de investigação – o espaço vital – e busca formular leis gerais que explicam o observado. As leis formuladas devem explicar causal e dinamicamente os fenômenos observados. Entretanto, as explicações não são elas mesmas diretamente observadas. Elas são intuídas.

 Se por um lado a teoria explica fenômenos observados recorrendo a hipóteses construídas, mantendo-se próxima daquilo que observa, por outro lado ela delimita o que são e como podem ser os fenômenos com os quais trabalham. Assim, toda teoria carrega consigo a possibilidade de encobrir os fenômenos observáveis, determinando suas possibilidades de ser compreendido. Com base na fenomenologia, afirma-se  que a teoria de campos, sendo uma explicação que recorre a teorias da física, encobre o fenômeno que ela busca investigar, que é a existência humana nas suas inter-relações. Ao recorrer ao modelo da física, a teoria de campos concebe o ser humano como um objeto entre os demais, regido pelas mesmas leis que regem todos os objetos. A fenomenologia, por outro lado, é um esforço de permitir que o fenômeno se mostre a partir de si mesmo. Assim, o ser humano deve poder aparecer para a compreensão do psicólogo a partir de sua humanidade, que Heidegger designa de ser-aí, e não de sua objetividade.

O conceito físico de Campo

A teoria de campo que fundamenta a abordagem gestaltica de coordenação de grupos é derivada do modelo explicativo da natureza. Segundo Köhler, um dos pioneiros da Escola da Gestalt, desde que a psicologia se apropriou da noção de campo na física moderna, “a psicologia da Gestalt se tornou uma espécie de aplicação da física dos campos a partes essenciais da psicologia.” (Köhler apud Schultz & Schultz, 1992, p.298). No final do século XIX, a física inicia a aceitação da noção de campo. O eletromagnetismo, por exemplo, passa a ser compreendido de maneira mais convincente: mesmo sem tocar o imã, o  ferro à sua volta é movido pelo campo eletromagnético. Para a física, campos de força são “regiões ou espaços cruzados por linhas de força, como as geradas por uma corrente elétrica ou um imã.” (Schultz & Schultz, 1992, p.298).

Na definição de Hawking: “Campo: Algo que existe no espaço e no tempo, em oposição a uma partícula que existe apenas em um ponto no tempo.” (Hawking apud Yontef, 1998, p.188). Esse modelo teórico visa ultrapassar a teoria de campo newtoniana. Na física, o campo é algo objetivo, que pode ser analisado a partir de suas propriedades objetivas, conforme a citação de Hawking acima. Na física mecanicista-newtoniana, o campo é um vazio no qual corpos podem se deslocar. Os corpos exercem forças entre si, mas o espaço entre eles é apenas um vazio. Com a física moderna, o campo pode ser decomposto em partes menores, que são as forças. Elas formam uma estrutura ordenada que tende ao equilíbrio. O físico Faraday “concebe o espaço inteiro como um campo de forças onde as linhas de forças são geralmente curvas; aquelas que são devidas a um corpo se estendem em todos os sentidos a partir deste corpo, e sua direção é modificada pela presença de outros corpos.” (Garcia-Roza, 1972, p.58.). As forças tendem a equilibrar-se. A célebre frase de Lavosier “nada se cria, nada se perde, tudo se transforma” concentra a idéia de que o universo é um campo de forças equilibrado. Einstein postula o universo como ordenado e estruturado. Lewin parte disso para representar graficamente um campo no qual um indivíduo é inserido, desenhando as forças de atração e repelência direcionadas à recuperação do estado de equilíbrio. Assim, o campo é uma estrutura de forças que tende ao equilíbrio. Por exemplo, a percepção de um borrão de tinta pode revelar-se sem sentido. Num segundo momento, um sentido começa a aparecer, de modo que o borrão de tinta torna-se algo reconhecível. (Parlett, 1991, p.68).  O surgimento do significado se deve a uma “correção de um desequilíbrio no campo perceptivo.” (Parlett, 1991, p.69) Uma forma surge na percepção a partir do equilibrar-se de um conjunto de forças que compõem a interação entre a percepção e o objeto percebido (borrão de tinta).

Na teoria de campos de Lewin, o conceito de campo é complementado com a concepção de “forma” elaborada por Ehrenfels, autor que tem como base a fenomenologia. Para esse autor: “Os fatos psíquicos são formas, isto é, unidades orgânicas que se individualizam e se limitam no campo espacial e temporal de percepção e de representação.” (Dartigues, 1992, p.39). Ehrenfels apóia-se na enunciação do “princípio de pregnância” de Wertheimer, que diz “A forma é tão boa como pode ser nas condições atuais.” (Ehrenfels apud Garcia-Roza, 1972, p.55). Dartigues exemplifica essa concepção: “uma gota de óleo pingada num líquido não miscível toma um forma esférica; se a fragmentamos ao mexê-la, cada um dos fragmentos retoma logo essa forma esférica.” (Dartigues, 1992, p.39) Pelo referido princípio, a forma se dá à percepção a partir de sua própria estrutura. Isto é, aquilo que se oferece à percepção possui uma estrutura inerente anterior à percepção. Garcia-Roza (1972) explica esse fenômeno recorrendo ao princípio de pregnância:” O princípio enuncia que, em condições iguais, os estímulos que formam uma boa figura terão uma tendênciaa serem agrupados. A boa  forma será a mais regular, simples e simétrica.” (p.55)

Yontef apresenta esse princípio na teoria de campos da seguinte maneira: “o campo se forma a si mesmo de maneira mais ordenada possível – com tanta limpidez e definição, direção e economia, estabilidade e força quanto as condições globais o permitam.” (Yontef, 1998, p.163). Assim, o campo determina suas partes, que formam um todo. O todo é maior e diferente da soma das partes. O significado de cada elemento surge a  partir de sua interação com o todo. A aplicação desse conceito de forma, que determina a  dinâmica dos campos, ao comportamento humano, leva Lewin a afirmar que “Se um certo tipo  de comportamento ocorre ou não ocorre não depende da presença ou ausência de um fato ou de um número de fatos vistos isoladamente, mas, sim, da constelação (a estrutura e forças) de  um campo específico como um todo. O ‘sentido’ de um único fato depende de sua posição no campo.” (Lewin apud Parlett, 1991, p.71).

Apropriando-se da concepção física dos campos, a teoria lewiniana descreve um campo como “uma teia de relacionamentos e existe num contexto de teias de relacionamentos ainda maior” (Yontef, 1998, p.185), concepção que o permite estender a concepção de campo para contextos mais amplos: pessoa, família, grupos sociais,  ad inifinitum. Todas as atividades psicológicas da pessoa ocorrem em um campo psicológico chamado de espaço vital (interação indivíduo-ambiente). O campo total da pessoa compreende todos os eventos passados, presentes e futuros que possam a influenciar. Esses eventos não podem ser tomados isoladamente ou atomicamente e adquirem seus significados a partir do todo.

O conceito de estrutura é, originalmente, um modelo teórico para explicar um fenômeno observado. Mas, como já mencionado, a teoria pode vir a substituir o fenômeno observado. Garcia-Roza (1972) refere-se a isso diferenciando as concepções epistemológica e ontológica da noção de estrutura. Enquanto modelo epistemológico, o conceito de estrutura é um modelo que auxilia na organização dos fenômenos observados diretamente nas dinâmicas de grupo. Parte-se dos acontecimentos para, recorrendo à teoria, considerar que cada evento é significativo e que esse significado deve ser buscado na inter-relação entre o evento e o todo (campo). Entretanto, a teoria pode reificar-se, de modo a determinar o observado. Garcia-Roza (1972) identifica na Gestalt uma concepção ontológica de estrutura, isto é, que “o gestaltismo admite que a estrutura é uma característica da própria realidade.” (p.55) Sendo assim, os comportamentos observados numa dinâmica de grupo são, por natureza, organizados, estruturados, regidos por leis de forças magnéticas e tendentes ao equilíbrio.

Conclusão

O conceito de campo na teoria da Gestalt, que fundamenta a compreensão das relações interpessoais na dinâmica de grupos, funda-se no conceito físico de ‘campo’ e na noção de ‘forma’ ou ‘estrutura’ subjacente. Essa apropriação é uma maneira de superar o modelo mecanicista e causal que domina a psicologia na primeira metade do século XX, garantindo para os fenômenos ‘psicológicos’ uma conotação de dinâmica, de movimento e de energia. (Yontef,1998, p.188) A fenomenologia reconhece essa contribuição. Entretanto, questiona a apropriação de modelos das ciências naturais para a compreensão dos fenômenos humanos que aparecem nas dinâmicas de grupo.

Na medida em que explica as inter-relações pessoais a partir de leis mecânicas, o psicólogo da teoria de campos está reificando o humano. O fenômeno que se mostra são relações humanas. Uma leitura fenomenológica descreve essa relação. Esse passo é compartilhado pela gestalt. Uma abordagem fenomenológica pode se deter apenas nessa descrição, aprofundando ilimitadamente. A descrição é suficiente para oferecer uma compreensão adequada do fenômeno e para pautar uma intervenção por parte do terapeuta. Mas, a gestalt dá mais um passo. Tendo descrito as relações humanas, recorre à teoria de campos para explicar as relações como um jogo de forças na direção de um equilíbrio. Essa compreensão pode encobrir o fenômeno que se apresenta, forçando as relações interpessoais a se adequarem ao modelo de campo, como num leito de Procusto. A compreensão que subjaz aí é de que o humano é um jogo de forças, como um imã. Nesse modo de compreender o fenômeno, o psicólogo determina que o humano é um objeto, reificando-o.

Desde seu surgimento, a fenomenologia é contrária  à reificação do homem. Husserl explicitou a correlação entre consciência e objeto, que foi retomada por Heidegger como intimidade do habitar do homem no mundo. É próprio do humano que ele seja com os outros, um ser em relação, ser-com-os-outros. Uma abordagem fenomenológica das interrelações humanas pode descrever e explicitar os vários modos de relação, sem a necessidade de teorias explicativas. Ao fazer isso, preserva o humano na sua humanidade, sem transformá-lo em objeto.

Fontepesquisada<http://fenoegrupos.com/JPM-Article3/pdfs/evangelista_teoria_de_campo.pdf>

POSTED BY SELETINOF AT  9:24 PM