Arquivo mensal: junho 2007
ERI NOBUCHIKA – VOICE
Os temas musicais de nosso blogue agora serão também propostos em forma de vídeos… "a musicalização é um processo de construção do conhecimento, que tem como objetivo despertar e desenvolver o gosto musical, favorecendo o desenvolvimento da sensibilidade, criatividade, senso rítmico, do prazer de ouvir música, da imaginação, memória, concentração, atenção, auto-disciplina, do respeito ao próximo, da socialização e afetividade, também contribuindo para uma efetiva consciência corporal e de movimentação"… dada esta importância capital da musicalização, aqui é indispensável sua utilização! Esperamos que se divirtam!
MASSA-CARGA, RENORMALIZAÇÃO DE
A renormalização da massa-carga serve para suprimir, dentro do possível, as divergências que aparecem na teoria quântica de campos. A ideia fundamental é a seguinte: A massa de uma partícula elementar – por exemplo, de um elétron -, se compõe de duas partes: 1) a massa mecânica; 2) a massa correspondente à energia da carga elétrica. A massa que observamos é a soma de ambas. Quer dizer:
Analogamente, a carga se compõe de duas partes: a carga própria do átomo e a devida à polarização do vazio. Como antes, podemos observar somente a soma de ambas. Escreveremos, pois:
Os segundos termos dos primeiros membros destas duas igualdades – massa aparente e carga aparente – podem calcular-se com base na teoria quântica de campo. A este respeito, esta proporciona sempre expressões divergentes, que não são compatíveis com os valores finitos da experiência, ou seja, com os segundos membros destas ditas igualdades: cálculos das flutuações do estado fundamental nos campos de elétrons tornavam massa e carga aparentes do elétron infintas, contrariando as observações; mas na década de 40, os físicos Richard Feynmen, Julian Schwinger e Shin’ichiro Tomonaga desenvolveram um meio de remover ou ‘subtrair’ esses infinitos e lidar somente com os valores finitos observados da massa e carga. Por este motivo, então, se introduz a hipótese de que existem uma massa e uma carga próprias da partícula elementar, de tal modo que somadas com o correspondente termo divergente, deduzido da física de campo, proporcionam, precisamente, o valor que se observa. Naturalmente, estas magnitudes hão de ter o mesmo grau de divergência que as já existentes. Como são essencialmente inobserváveis (já que ao elétron não podemos quitar-lhe a carga), isto não supõe dificuldade alguma. Esta superposição das duas partes recebe o nome de renormalização
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Renormalização em Teoria Quântica de Campos:
<https://www.lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/39117/000825783.pdf?sequence=1>
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POSTED BY SELETINOF 10:45 AM
CERN: UMA ODISSÉIA CIENTÍFICA PARA DESCOBRIR A ORIGEM DO UNIVERSO
Tecnologia Grid entra em cena no auxílio à manipulação das informações
"O que é a matéria?", "do que é feita?", "qual é a sua origem?" e "como permanece unida formando objetos tão complicados como as estrelas, os planetas, o ar e os seres humanos?" A tarefa do maior laboratório de física de partículas do mundo, o Cern (Centro Europeu de Pesquisa Nuclear, do francês – Conseil Européen pour la Recherche Nucléaire) é buscar a resposta para estas questões fundamentais da natureza. Para tal objetivo, físicos do mundo inteiro se reúnem numa colaboração internacional, que requer uma avançada tecnologia de comunicação e compartilhamento de dados.
Utilizando uma espécie de "túnel do tempo", os físicos simulam uma viagem até uma fração de segundo após o "Big Bang", a grande explosão que resultou no universo, de acordo com uma das teorias físicas. O "túnel" de que se trata é um acelerador de partículas: uma infra-estrutura capaz de provocar choques entre as partículas que compõem a matéria e desmembrá-las, tal como se encontravam após o “Big Bang”. E, através dos detectores – equipamentos acoplados no acelerador de partículas, os pesquisadores observam o que se passa a partir do choque dessas partículas, o que os possibilita estudar a estrutura da matéria.
Fundado em 1954, na Suíça, o Cern completa 50 anos em 2004, se notabilizando pelo exemplo de colaboração internacional: são, ao todo, 56 participantes, dentre países e organizações internacionais. Atualmente, está sendo preparado, para 2007, o próximo acelerador, que está sendo construído num túnel subterrâneo de 27 Km: o Large Hadron Collider (LHC), no qual estarão acoplados quatro detectores – Atlas, Compact Muon Solenoid (CMS), LHCb e A Large Ion Collider Experiment (Alice).
A partir do LHC, espera-se encontrar as respostas que faltam para completar o Modelo Padrão, ou seja, o quebra-cabeça criado pelos físicos para explicar a origem do universo. Uma pista para encontrar as respostas é a provável existência do Boson de Higgs, a partícula que seria responsável por agregar massa às partículas.
Dois detectores estarão pesquisando o Boson de Higgs
A corrida pela descoberta do Boson de Higgs vem despertando o interesse de físicos do mundo inteiro e motivou a construção de dois dos quatro detectores que estarão acoplados ao LHC: o Atlas e o CMS, ambos contando com a colaboração brasileira.
Medindo 45 metros de comprimento e com a altura aproximada de um prédio de cinco andares, o Atlas é um dos maiores experimentos de física de partículas já projetado. O orçamento total do projeto foi estimado em U$$ 600 milhões de dólares, quantia esta que só foi possível diante da grande quantidade de países participantes. O detector é resultado de uma colaboração internacional, que envolve 1800 cientistas de mais de 150 laboratórios e instituições em 34 países.
O CMS envolve 1.870 cientistas distribuídos em 150 instituições em 31 países. O Brasil contribui com 30 pesquisadores, incluindo físicos, engenheiros e cientistas da computação, divididos em sete instituições (Uerj, UFRGS, UFRJ, CBPF, UFBA, Unesp e USP). O objetivo do CMS será o mesmo do Altas, ou seja, comprovar a existência do Boson de Higgs .
Rede Grid é a solução para a manipulação da informação geradas pelo LHC
A previsão de dados coletados pelo LHC, ao longo de um ano, é de 20 petabytes, ou seja, cerca 20 mil terabytes. Segundo o professor de física da Uerj, Alberto Santoro, que coordenda o consórcio brasileiro na colaboração do CMS, uma das maiores dificuldades que a colaboração vai encontrar será a manipulação de uma quantidade de dados científicos dessa ordem de grandeza.
A solução encontrada para amenizar o problema foi a utilização da tecnologia Grid que, ao invés de concentrar toda a informação no Cern, como ocorre atualmente, é baseada no compartilhamento da informação entre diversas máquinas, de forma a facilitar o acesso dos físicos aos dados e arquivos a serem pesquisados ou transferidos.
A Uerj fará parte do projeto de Grid, armazenando no Brasil parte das informações, não só do LHC, mas de todo o Cern, o que dará ao País maior prestígio na colaboração. Para que este projeto se concretize é necessário que a rede da Uerj seja facilmente acessível para os demais físicos do Cern espalhados pelo mundo, mas, atualmente, a conectividade disponível não é suficiente. A idéia é começar com 622Mbps e chegar em 2007, ano de inauguração do LHC, com 10Gbps – explica Santoro.
Ao comentar tantos requisitos tecnológicos, necessários ao desenvolvimento de avançados sistemas de informação e, em especial, o projeto Grid, Santoro menciona a importância da RNP para a participação brasileira no projeto.
— Sem a RNP, fornecendo toda a infra-estrutura de rede necessária, não há projetos de cooperação internacionais nos quais o Brasil seja capaz de se inserir. Além da intensa troca de informação, essencial para colaborações desse porte, há outras aplicações, tais como videconferência, que só podem ser realizadas através das redes de pesquisa avançadas dedicadas à comunidade acadêmica mundial — comenta Santoro.
Texto extraído do site da RNP – Rede Nacional de Ensino e Pesquia (11.05.2004).
POSTED BY SELETINOF 10:37 AM
PSYCHOPHYSICAL HYPOTHESIS JUNG/PAULI
CARL G. JUNG – WOLFGANG PAULI – NISE DA SILVEIRA – MÁRIO SCHENBERG
Interface Psicofísica – Unificação Psicomaterial
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Ao psicólogo cabe explicar o vivido no marco das ciências naturais ou, nas palavras do próprio Kohler, “comparar os fenômenos psicológicos como os fatos da ciência natural” – eis a tarefa da psicologia. Já ao fenomenólogo cabe fundamentar o vivido, sem fazer qualquer afirmação a respeito da natureza, porque tal fundamentação é realizada por meio da redução fenomenológica, isto é, da suspensão de qualquer juízo acerca da existência do mundo.
Márcia Morais
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No começo do século XX parecia ao homem do ocidente que todos os mistérios tinham sido desvendados. A visão do mundo segundo a física newtoniana era de uma clareza confortadora. Darwin explicava a origem das espécies. Marx descobria as leis que regem o desenvolvimento das sociedades. Freud trazia o mundo obscuro do inconsciente para o domínio da pesquisa científica, demonstrando que os fenômenos psíquicos inconscientes, mesmo os extravagantes e absurdos, estavam sujeitos às leis da causalidade. Fiel ao clima de opinião de sua época, Freud era um rigoroso determinista. Na INTRODUÇÃO À PSICANÁLISE, escreve: “quebrar o determinismo, mesmo num só ponto, transtornaria toda concepção científica do mundo“.
Fig 1 – Diagrama Hipótese Jung/Pauli
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De fato, a física moderna bouleversou a concepção do mundo construída pela física clássica, concepção que parecia absolutamente inabalável até os fins do século XIX. O indivisível átomo revelara-se divisível. Abriam-se brechas no determinismo: nem sempre os átomos comportavam-se de acordo com as leis causais. Certos fenômenos, no campo da microfísica, passaram a ser estudados à luz de leis estatísticas, ou seja, de leis de probabilidade. Einstein provou que a matéria e energia são equivalentes. Verificou-se que a luz apresenta simultaneamente os caracteres de onda e de corpúsculo. O tempo deixou de ser uma grandeza absoluta, pois, para velocidades próximas da velocidade da luz, o tempo passa mais devagar. O tempo, então, é relativo. Perplexos, retraímo-nos diante desses conceitos que perturbam nossa segurança. Não queremos ver além das fronteiras do mundo estável de Galileu e de Newton. Compreende-se a atitude de recuo: o abalo das próprias bases que serviam de ponto de apoio às operações de pensamento provocou deslocamento imprevistos a longa distância. Opostos, até então irredutíveis, deixavam de ser opostos. Argumentos lançados durante séculos contra determinados alvos não mais os atingiam porque os próprios alvos se tinham dissolvido ou mudado completamente de posição.Tanto quanto Freud, Jung investigou a causalidade nos campos da psicologia e da psicopatologia. Seus estudos sobre as associações verbais e os livros PSICOLOGIA DA DEMÊNCIA PRECOCE E O CONTEÚDO DAS PSICOSES, mostram que, mesmo nos distúrbios psíquicos mais graves, é possível decifrar o sentido de sintomas de aparência desconexa, encontrando-lhes elos causais.
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Fig 2 – Diagrama Unus Mundus
Baseado na Estrutura da Psique de C. G. Jung
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Fig 4 – Diagrama Psicofísico Exterio/Interior
Baseado na Estrutura da Psique de C. G. Jung
Fig 5 – Diagrama Paradígma Psicofísico.
Aqui, o Mundo Matemático de Platão se coloca entre o Mundo Exterior (Fenomênico) e o Mundo Interior (Material / Mental) – ambos incorporando o Devir de Heráclito -, da mesma forma com que Platão se utilizou da Matemática para escamotear o Devir Heracliteano.
NOSSO PARADIGMA PSICOFÍSICO
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Em nosso diagrama, buscando a identidade corpo-psique postulada na teoria junguiana, está representado um conceito fundamental da psicologia analítica: o arquétipo psicóide (UNUS MUNDUS). Segundo Jung, uma pessoa é um todo e não apenas uma reunião de partes, daí a concepção da identidade corpo-psique. Assim, embora nosso diagrama possua regiões bem delimitadas, na verdade, tais regiões, como dimensões da realidade, se encontram entrelaçadas ou superpostas no HOMEM: unidade Corpo-Psique ou Corpo-Mente. Em nosso vídeo KOSMOS: PHYSIOSPHERE, BIOSPHERE AND NOOSPHERE, o Vácuo Quântico é estabelecido como homólogo ao Unus Mundus.
Diagramaticamente, representamos o Mundo Ideal, correspondendo ao Realismo de Platão, e o Mundo Material, correspondendo ao Realismo de Aristóteles: em tais realidades se encontram os númenos ou coisas-em-si, os quais, metafisicamente, segundo Kant, não podem ser conhecidos: sendo ao homem, somente possível conhecer os fenômenos. Ainda, refletindo as mudanças na metafísica patrocinadas por Descartes e Hume, concomitantemente com a critica de kantiana à metafísica dogmática tradicional, representamos os fenômenos abstrato e concreto como partes do Mundo Fenomênico (Devir de Heráclito) – estes, objetos de estudo do Racionalismo e do Empirismo, respectivamente. Por fim, temos também representado no diagrama o Mundo Matemático de Platão, com o qual podemos fazer um certo assemelhamento com o Simbólico em Lacan.
Importante verificarmos que, dentre os autores que mais influenciaram o pensamento junguiano, Kant se destaca como aquele cujo sistema melhor ofereceu recursos para Jung fundamentar sua psicologia. Jung compreende “fenômeno” em um sentido kantiano, ou seja, toma o fenômeno em contrapartida ao númeno, ou seja, aquilo que aparece em oposição às coisas em si mesmas. Além disso, Jung concorda com a idéia de Kant de que o númeno não é acessível ao conhecimento, de modo que toda ciência, para ser válida, precisa voltar-se para o campo dos fenômenos. Uma psicologia científica deve, por sua vez, ocupar-se de fenômenos psíquicos e não de metafísica.
Jung frisava a importância de diferenciar as imagens arquetípicas dos arquétipos em si mesmos, as representações daquilo que as fomenta, e a concretabilidade daquilo que não podemos conceber. Em síntese, por detrás de qualquer imagem consciente há sempre um númeno inconsciente, inalcançável para nossa razão.
Diferentemente do fenomenalismo kantiano, aqui utilizado epistemologicamente no trato com os fenômenos psico-materiais, ao abordarmos o que seja a consciência, partimos basicamente da conscepção fenomenológica husserliana, tendo como pano de fundo, óbvio, a fenomenologia de Husserl. Assim, consideramos a consciência definida segundo Husserl, porém, englobando ainda as concepções de Heidegger e Merleau-Ponty. Assim, representada como Acto em nosso diagrama, em Husserl a consciência se identifica com o simples ato de conhecer, que como uma vivência, jamais se confunde, quer seja com o objeto, quer seja com o sujeito.
Agora, importante ressaltar que, igualmente a Platão, para escamotear a transformação, o Devir (falsa aparência) – aqui dada tanto no Unus Mundus quanto no Mundo Fenomênico -, intercalamos entre estes dois mundos, o MUNDO MATEMÁTICO DE PLATÃO; ou seja, do mesmo modo como a figura geométrica (Ser que guarda a identidade) serviu à Platão, quando da sua utilização para representar os seus quatro elementos platônicos (terra, água, ar e fogo):
“Nos últimos diálogos de Platão em Timeo, no qual ele pretendeu dar um sistema do Mundo, temos uma tentativa de explicar os elementos e suas transformações por meio de figuras geométricas. Platão começa por afirmar que “todos os triângulos tiram o seu princípio de dois tipos de triângulos retângulos”, um isósceles e outro escaleno. Em seguida dá-nos a chave de todo o mistério: “Escolhamos portanto dois triângulos com os quais são constituídos os corpos do fogo e de todos os outros elementos: um é isósceles, o outro tem sempre o quadrado do seu lado (cateto) maior, triplo do quadrado do mais pequeno. E agora, precisemos o que foi dito acima. Os quatro elementos (terra, água, ar e fogo) tinham-nos parecido nascer sempre reciprocamente uns dos outros, mas era falsa aparência. Com efeito, os quatro gêneros nascem mas é dos triângilos de que acabamos de falar”. Ora, aí está, o nosso grande filósofo conseguiu o seu objetivo maior, ou seja, escamotear a transformação: pôs entre o Devir (falsa aparência), e nós, a figura geométrica – o Ser que guarda a identidade.” (CARAÇA).
Tudo aqui, entretanto, reverbera a doutrina da vontade criadora, da vontade como força artística, tal como Nietzsche a concebe, a qual se define como uma nova maneira de pensar aplicada ao Devir. DaÍ sendo a realidade do devir, da mudança, a realidade resultante de uma ação contínua, um fluxo de vida constante:
A Realidade, em sua integralidade, não é senão uma perpétua oscilação entre a ATUALIZAÇÃO e a POTENCIALIZAÇÃO, não havendo, porém, atualização absoluta. Todavia, atualização e potencialização, não bastam para uma definição lógica coerente da Realidade. O movimento, a transição, a passagem do potencial ao atual, portanto, não é concebível sem um dinamismo independente que implica um equilíbrio perfeito, rigoroso, entre a atualização e a potencialização – equilíbrio este que permite precisamente essa transição. Assim, assegurando tal dinamismo, a Realidade possuiria, segundo Lupasco, uma estrutura ternária: toda manifestação da REALIDADE se dá através da coexistência de três aspectos inseparáveis em um todo dinâmico acessível ao conhecimento lógico, racional: Sujeito, Objeto, Terceiro Oculto”.
Enfim, toda nossa pesquisa parte fundamentalmente da Hipótese de Carl Jung e Wolfgang Pauli.
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Fig 6 – Se o psicólogo, nas suas investigações através das camadas mais profundas da psique, encontra a matéria, por sua vez o físico, nas suas pesquisas mais finas sobre a matéria, encontra a psique.
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Conjectura Pauli-Jung
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Do trabalho de Wolfgang Pauli e Carl G. Jung resulta uma abordagem filosófica – que Harald Atmanspacher intitula a conjectura de Pauli-Jung -, do monismo de duplo-aspecto que tem uma característica adicional muito específica, a saber, que diferentes aspectos podem mostrar uma complementaridade em um sentido quantum físico. Ou seja, a conjectura de Pauli-Jung implica que, com relação aos estados mentais e físicos, pode haver descrições incompatíveis de diferentes partes que emergem do todo. Isso está em estreita analogia com a física quântica, onde propriedades complementares não podem ser determinadas em conjunto com precisão.
Fig 7 – Albert Einstein apontou Mário Schenberg como um dos dez maiores cientistas de sua época; e disse: “Se eu tivesse de escolher um cientista como continuador de minha obra, seria o brasileiro Schenberg“.
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“Heisenberg, falando em seu livro, cujo título da edição em português é Física e Filosofia, sobre a importante unificação da química com a física, que havia sido feita no século XX com o patrocínio da mecânica quântica, faz o seguinte questionamento: ‘Qual seria o próximo passo? O novo seria a unificação da física com a biologia, esta entendida num sentido amplo, englobando citologia, e todas as áreas ligadas ao homem’. E não podemos esquecer isto. É grande a lição da mecânica quântica, se já não era lição na sabedoria comum, de que toda nossa ciência é uma criação humana. Por isso, talvez a coisa mais importante seja compreender melhor o homem, do que essas teorias da Grande Unificação e outras coisas nesse sentido. Sem contar que nosso interesse em conhecer o homem é maior do que conhecer as teorias da Grande Unificação. Nós estamos num momento terrível da história da Humanidade, porque vivemos uma época em que não sabemos se daqui a dez anos ela existirá ou não. Uma guerra nuclear nas condições atuais, certamente levaria à destruição de toda vida sobre a Terra.
Assim, vejo uma grande sabedoria nesta previsão de Heisenberg. Porque na biologia, penso eu, também incluiria a psicologia e outras áreas mais diretamente ligadas ao homem. Seria um progresso mais na direção do Homem do que do Cosmo. Evidentemente, esta maior compreensão do homem, poderia eventualmente modificar também radicalmente, a nossa compreensão do Cosmo. Portanto, estou inclinado a ver mais dessa maneira: os passos mais essenciais seriam descobrir algo qualitativamente diferente (não estou dizendo que não se façam progressos importantes em partículas elementares ou noutros ramos da física). (…) Mas, ao que parece, o próximo grande passo na física, ou nas ciências naturais, digamos assim, seria na direção de uma compreensão maior da Vida e do Homem. Acreditava Heisenberg que com os conceitos atuais da física, não conseguiríamos fazer esta unificação, porque nos falta algo muito essencial. O que caracteriza a Vida é a historicidade, um tempo histórico, que não é o tempo da física. O tempo físico é mais matemático, e o tempo histórico tem outras características. Ainda, Heisenberg achava muito importante introduzir na física algo que se aproximasse do tempo histórico. Na física ou fora dela, o fato é que esta introdução seria o mais importante. (…) Eu pertenço a uma certa tradição pois afinal fui aluno de Pauli e sofri sua influência; assim acredito que talvez a união da física com a biologia, seja precedida da união da física com a psicologia.” (Mário Schenberg).
POSTED BY SELETINOF AT 2:48 PM
PREFIRO
Prefiro os que me criticam porque me corrigem aos que me adulam porque me corrompem.
Santo Agostinho
POSTED BY SELETINOF AT 7:14 PM
JUNG – VIDA E OBRA
Carl Gustav Jungnasceu a 26 de julho de 1875, em Kesswil, aldeia pertencente ao cantão da Turgovia, Suiça. Seu pai, Paul Achilles Jung, aí exercia as funções de pastor protestante. O menino Carl Gustav tinha quatro anos quando o pai foi transferido para Klein – Huningen, nos arredores de Basiléia. Foi em Basiléia onde Jung fêz todos os seus estudos, inclusive o curso médico. Esta cidade era, na época, um dos mais importantes centros culturais da Europa. Basta lembrar que Nietzche deu cursos memoráveis na Universidade de Basiléia no período 1869-1879 e que o historiador-filósofo Jacob Burckhardt ocupava, por estes tempos, uma cátedra nessa mesma Universidade. Também ecoava ainda naqueles dias a fama do reformador da Faculdade de Medicina de Basiléia, Carl Gustav Jung, avô paterno do futuro psicólogo, que recebeu o nome de seu ancestral ilustre. Rumores corriam de que o velho C. G. Jung fosse filho ilegítimo de Goethe. Nada ficou provado neste sentido, mas comentava-se que tanto seus traços fisionômicos quanto seu inescedível encanto pessoal o assemelhavam ao autor do Fausto.
No seu livro de MEMÓRIAS, Jung não esconde as restrições que fazia ao pai. Desde muito cedo, ele viu no pastor o homem estagnado numa condição medíocre, a quem faltaram forças para seguir sua linha própria de desenvolvimento; o homem que não enfrentava as dúvidas religiosas que o atormentavam, segundo parecia ao filho. O pastor temia as experiências religiosas imediatas, agarrava-se à fé, amparava-se na Bíblia e nos dogmas. Jung nunca poderia aceitar tal atitude. Sentia-se muito mais afim com sua mãe. Menino ainda, descobriu que existiam nela duas personalidades. Uma convencional, correspondente à esposa de um pastor, que exigia do filho boas maneiras e fazia-lhe recomendações impertinentes sobre o modo de usar o lenço ou coisas semelhantes. E outra, investida de estranha, misteriosa, dotada de algo que às vezes lhe infundia medo. Quando esta segunda personalidade emergia, o menino Carl Gustav percebia a voz de sua mãe que soava grave e mais profunda.
É curioso assinalar que nas Memórias de Jung não se encontre referência a nenhum período de fervor religioso vinculado ao protestantismo,nem mesmo na infância. A idéia de Deus, entretanto, fascinava-o intensamente. E o mais singular é que as cogitações do filho do pastor não giravam em torno da figura de Cristo, tema fundamental dos ensinamentos protestantes. Ele comparava o que lhe diziam com aquilo que via em torno de si. Impressionava-se com os “imerecidos sofrimentos do homem e dos animais” e isso levava-o a imaginar que Deus houvesse mesmo intencionalmente criado um mundo repleto de contradições. O menino pensava e sentia Deus como uma poderosa força avassaladora que trazia consigo bemaventurança mas também desespero e terror. Guardava secretos esses pensamentos. A quem poderia comunicá-los se eram tão diferentes de tudo quanto se dizia na igreja ou em casa, nas conversações do pai com seus amigos também pastores? Vinha-lhe então o sentimento de que algo muito profundo o separava dos demais.
O problema da escolha de profissão não foi fácil. Tudo o interessava. A arqueologia o atraía e simultaneamente as ciências naturais. Por fim decidiu-se pela medicina. Seu pai obteve que a Universidade concedesse ao jovem estudante uma bolsa, pois a família era demasiado pobre para enfrentar as despesas de um curso superior.
Tudo fazia crer que Jung se espacialisasse em clínica médica. O catedrático o distinguia e já o convidara para seu assistente. Mas aconteceu que quando se preparava para o exame de psiquiatria do currículo médico, leu no prefácio do tratado de Krafft-Ebing conceitos que o atingiram em cheio, abrindo-lhe a inesperada perspeciva de que, na psiquiatria, seus interesses pela filosofia, pelas ciências naturais e médicas, poderiam encontrar um foco vivo de convergência. Imediatamente, para surpresa geral, escolheu a psiquiatria.
Jung concluiu o curso médico em 1900, aos 25 anos, e logo deixou Basiléia para vir ocupar o cargo de segundo assistente no hospital Burgholzli, Zurique (10 de dezembro de 1900). Este hospital vivia na ocasião um período de intensa atividade científica, sob a direção de Eugen Bleuler, sem dúvida um dos maiores psiquiatras de todos os tempos.
A carreira de Jung, no Burgholzli, foi das mais brilhantes. Já em 1902 passava a primeiro assistente e defendia sua tese de doutoramento. Este trabalho teve por título – Psicologia e patologia dos fenômenos ditos ocultos. Trata-se do estudo do caso de uma jovem medium espírita. Jung, em 1902, interpreta os numerosos espíritos manifestados, como personificações de aspectos diferentes e até opostos da própria medium e classifica-os em dois grupos: o tipo grave-religioso e o tipo alegre-libertino. Mas igualmente “ela se sonha” num estado superior que ultrapassa os extremos que a dilaceram. O espírito Ivenes, de categoria mais alta, encarna sua personalidade segunda, ainda em processo de desenvolvimento.
No ano de 1905 foi designado primeiro Oberartz, isto é, assumia o posto imediatamente abaixo de Bluler na hierarquia do hospital. No mesmo ano era nomeado Privat-Dozent, iniciando cursos de crescente repercussão, na Universidade de Zurique.
No Burgholzli, Jung trabalhou incansavelmente como colaborador de Bleuler e como pesquisador original. Marcaram época suas experiências sobre associações verbais. Essas experiências, iniciadas com o intento de trazer esclarecimentos concernentes à estrutura psicológica da esquizofrenia, em breve transformavam-se, nas mãos do jovem pesquisador, num método de exploração do inconsciente. Conduziram-no à descoberta dos complexos afetivos. A conceituação de complexo, juntamente à técnica para detectálo, foi a primeira contribuição de Jung à psicologia moderna.
No ano de 1906 Jung publicou os ESTUDOS SOBRE ASSOCIAÇÕES; A PSICOLOGIA DA DEMÊNCIA PRECOCE, aparceu em 1907 e, a seguir, 1908, O CONTEÚDO DAS PSICOSES. Os dois últimos trabalhos demonstram que nas psicoses todos os sintomas, ainda os mais absurdos, encerram sinificações, descrevem as frustrações, desejos e esperanças dos doentes.
Somente em 1907 Jung entrou em contato pessoal com Freud. No dia 27 de fevereiro daquele ano Jung visitou Freud em Viena, e esta primeira visita prolongou-se por treze horas a fio de absorvente conversação. Freud logo reconheceu o alto valor de Jung e viu no suiço, no não judeu, o homem adequado para conduzir avante a psicanálise. Mas sobretudo viu nele “um filho mais velho”, um “sucessor e príncipe coroado” (carta de Freud à Jung, datada de 16.4.1909).
De 1907 à 1912 estabeleceu-se estreita colaboração entre Freud e Jung. No outono de 1909 viajaram juntos aos Estados Unidos, por ocasião das comemorações do vigésimo aniversário da Clark University. Freud ali pronunciou as célebres cinco conferências sobre psicanálisee Jung apresentou seus trabalhos relativos às associações verbais.
Em 1910 foi fundada a Associação Psicanlítica Internacioanl. Freud usou toda sua influência para que Jung fosse eleito presidente dessa associação e assim aconteceu. Mas, já em 1912, o livro de Jung, METAMORFOSES E SÍMBOLOS DA LIBIDO marcava divergências doutrinárias profundas que o separaram de freud. Eram ambos personalidades demasiado diferentes para caminharem lado a lado durante muito tempo. Estavam destinados a defrontar-se como fenômenos culturais opostos.
Jung casou-se em 1903 com Emma Rauschenbach, nascida em 1882. O casal teve cinco filhos. Emma era uma companheira devotada, solidária e muito interessada pelos problemas de psicologia. Dedicou-se durante longos anos a pesquisas sobre a legenda do Graal, morrendo, porém, antes de concluir sua obra (1955). Seu livro – INTERPRETAÇÃO PSICOLÓGICA DA LEGENDA DO GRAAL, levado a termo pela Dra. Marie Louise von Franz, foi publicado em 1960.
Desde 1909 até morrer Jung residiu na mesma casa, na Seestrasse 228, às margens do lago de Zurique.
Jung era um homem alto, bem construído, robusto. Tinha um vivo sentimento da natureza. Amava todos os animais de sangue quente e sentia-se com eles “estreitamento afim”. Amava as escaladas das montnhas, porém preferia velejar sobre o lago de Zurique. Possuía seu barco próprio. Na mocidade passava às vezes vários dias velejando em companhia de amigos, que se revesavam no leme e na leitura em alta voz da Odisséia. Igualmente velejava sozinho e o fez até a idade bastante avançada.
Aos 38 anos (1913) Jung havia cumprido largamente todas as tarefas da primeira metade da vida. Tinha constituído família; afirmara-se no campo profissional, sendo procurado por enorme clientela que acorria de toda a Europa e da América; conquistara renome científico mundial.
Agora ia abrir-se uma nova fase na sua vida. Haviam sido rompidos os laços com o grupo psicanalítico. E neste mesmo ano de 1913, Jung renunciou ao título de Privat-Dozent (já em 1909 demitira-se do cargo de psiquiatra do Burgholzli), abandonando assim a carreira universitária. Começava um difícil período de solidão.
Começava um período de ativação do inconsciente, de intensas experiências interiores. De sonhos impressionantes, mesmo de visões. Jung decidiu-se a aceitar que as imagens do inconsciente emergissem. Pareceu-lhe que a melhor solução seria esforçar-se por decifra-lhes o sentido, mantendo a consciência sempre vigilante e não perdendo o contato com a realidade exterior.
Foi através da interpretação de seus sonhos e experiências internas que Jung chegou à descoberta de um centro profundo no inconsciente, centro ordenador da vida psíquica e fonte de energia.
Atento aos fenômenos que se desdobravam no íntimo de si próprio, apreendeu o fio e a significação do curso que tomavam, verificando que outra coisa não acontecia senão a busca da realização da personalidade total (processo de individuação – ver capítulo VI).
Livre dos preconceitos científicos ainda vigentes, nas suas MEMÓRIAS escritas aos 83 anos, Jung refere-se às experiências interiores vivenciadas entre dezembro de 1912 e fins de 1918, dizendo: “Levei praticamente 45 anos para destilar dentro do recipiente de meu trabalho científico as coisas que experimentei naquele tempo.”
Para que o indivíduo não seja tragado pelo inconsciente, adverte Jung, é necessário manter-se firmemente enraizado na realidade externa, ocupar-se de sua família, de sua profissão. E, sem perder o ânimo, encarar face a face as imagens do inconsciente. Certo, a tarefa é difícil. Para levá-la a termo sem nenhuma ajuda, segundo Jung o conseguiu, o requisito prévio será a existência de um ego bem estruturado e coeso, pois o processo inconsciente terá de ser continuamente ligado ao consciente.
Jung nunca interrompeu seu trabalho profissional necessário à manutenção da família, não tendo ele emprego nem rendas. Serviu durante a primeira guerra mundial como comandante do campo de prisioneiros de Chateau d’Oex.
Os acontecimentos internos serão auto-observados e experenciados intimamente e “não devem de modo algum tocar na superfície visível da vida”.
Só a publicação recnte das MEMÓRIAS revelou a aventura vivida corajosamente por Jung. Nada o faria supor na sua conduta. Se durante o tempo dessas experiências internas Jung não publicou nenhum livro, escreveu, entretanto, vários ensaios da mais lúcida construção científica, nos quais já são utilizados, sem que ninguém o pudesse supor, elementos dessas sofridas experiências que viriam a ser a base de toda a sua teoria psicológica e de seus métodos psicoterapêuticos. Destacam-se duas conferências pronunciadas em Londres, julho de 1914, Sobre a compreesão psicológica e sobre a importância do inconsciente em psicopatologia; A estrutura do inconsciente, 1916, posteriormente ampliado num livro fundamental, As relações entre o égo e o inconsciente; A psicologia do inconsciente, 1917; Sobre o inconsciente, 1918.
Em 1920, aparece TIPOS PSICOLÓGICOS. Poder-se-à dizer que este livro funciona como uma compensação ao período de excessiva introversão, forçada pelas experiências interiores, pois trata de entender as relações do homem com outros homens, com as coisas e com o mundo.
A paixão de conhecer a alma humana levou Jung a longas viagens. No ano de 1921 foi à África do Norte. Em 1924-1925 conviveu com os Índios Pueblo da América e em 1925-1926 esteve no Monte Elgon, na África Oriental Inglêsa. Certamente interessava-o, e muito, a alma do primitivo mas sua principal intenção nessas viagens, segundo declara, era encontrar oportunidade para ver a imagem do européu refletida nos olhos de homens de outras culturas. E qual foi a imagem do branco que Jung captou? “Aquilo que de nosso ponto de vista chamamos colonização, missões aos pagãos, difusão da civilização, etc. Tem outra face – a face de uma ave de rapina procurando com diligente crueldade presas distantes – uma face digna de piratas e de salteradores de estrada”.
De suas viagens, Jung trouxe muito mais do que a imagem do branco refletida nos olhos dos colonizados, a análise das reações do europeu no mundo selvagem, ou importantes aquisições referentes à psicologia do primitivo. Trouxe a descoberta da significação cósmica da consciência. Impressionava-o que o nascer do sol fosse para o homem primitivo um momento de concentrada emoção, que parecia um denso de significações secretas. De outra parte observara que durante a noite o primitivo estava sempre inquieto e medroso, receando perigos misteriosos, mas quando chegava o sol recuperava a segurança, tudo se lhe afigurava bom e belo. Deduziu Jung que a escuridão noturna corresponde à noite psíquica primordial, ao estado de inconsciência e “o anhelo pela luz é o anhelo pela consciência”.
O período que se seguiu à publicação de TIPOS PSICOLÓGICOS foi principalmente dedicado por Jung ao reexame de suas intuições, vivencias pessoais e observações clínicas referentes ao inconsciente coletivo. Seus trabalhos sobre o conceito de inconsciente coletivo e os arquétipos foram, na maioria, primeiro apresentados em forma de conferências (nas reuniôes científicas internacionais denominadas Eranos, realizadas em Ascona) e só publicados em livros anos mais tarde, depois de revistos e amplamente documentados. Por exemplo: o ensaio Arquétipos do inconsciente Coletivo (Eranos – 1934), apareceu em livro, modificado e ampliado, vinte anos depois; o trabalho sobre o Arquétipo Mãe, sofreu laboração quase tão longa, pois nascido no Eranos de 1938 veio a tomar lugar nas obras de Jung em 1954.
Se a intuição é um relâmpago, se a experiência interior é um relâmpago, o trabalho científico necessariamente terá de ser consruido devagar e com prudência. Jung nunca se embriagou de orgulho nem pelo seu gênio nem pelas suas experiências interiores (experiências que outros freqüentemente interpretam como privilégios sobrenaturais). Se era um homem, outros homens deveriam ter vivido algo semelhante ao que ele estava vivendo. Pos-se então a buscar prefigurações históricas para suas experiências interiores e, nessas pesquisas, fez o surpreendente achado de que o processo pelo qual ele próprio passara correspondia ao processo de transformação alquímica.
A “arte” alquímica seria a projeção sobre a metéria de processos em desdobramento no inconsciente. Vivenciados pelos alquimistas, continuavam acontecendo no presente, segundo o simbolismo que os sonhos de homens e mulheres contemporâneos deixava entrever. Assim, a psicologia analítica encontrou, na alquimia, sua contraparte histórica.
Fiel ao seu método de trabalho, Jung apresentou essa descoberta numa conferência feita no Eranos de 1935 – Simbolismo dos sonhos e o processo de individuação, seguida, em 1936, de uma outra – A idéia de rendenção em alquimia. Essas conferências foram retrabalhadas e enriquecidas de enorme documentação e por fim publicadas num volume, sob o título de PSICOLOGIA E ALQUIMIA, em 1944.
A obra de Jung é comparável a um organismo vivo que cresce, se desenvolve e se transforma simultaneamente com seu autor.
Em 1945 Jung completou 70 anos. E estava no apogeu da atividade criadora. Prosseguia nas pesquisas sobre alquimia, publicando PSICOLOGIA DA TRANSFERÊNCIA (1946) e MISTERIUM CONIUNCTIONIS, livro que muitos julgam sua obra máxima, na qual trabalhou durante dez anos e que foi dado à publicação em 1955, quando o autor atingia os 80 anos.
Simultaneamente, escrevia numerosos ensaios, dentre os quais apenas citaremos RESPOSTA A JOB(1952), um dos seus livros mais belos e mais discutidos.
Sempre atento aos acontecimentos contemporâneos, depois dos 80 anos escreceu ainda PRESENTE E FUTURO, 1957, e UM MITO MODERNO (os discos voadores), 1958. Quando se poderia talvez pensar que os assuntos da prática médica não mais o interessassem, Jung apresentou, no Congresso Internacional de Psiquiatria, Zurique – 1957, um trabalho sobre a esquizofrenia, que é não somente interpretação teórica dessa doença, mas que também está cheio de indicações utilizáveis pelo psiquiatra clínico no trabalho cotidiano.
Seu último é um livro de memórias, mas memórias muito especiais. “Minha vida foi singularmente pobre em acontecimentos exteriores. Sobre estes não posso dizer muito, pois se me afiguram ôcos e desprovidos de consistência. Eu só me posso compreender à luz dos acontecimentos interiores. São estes que constituem a peculiaridade de minha vida e é deles que trata minha autobiografia”.
Nas MEMÓRIAS de Jung acompanha-se a realização de uma vida e de uma obra, inextrincáveis uma da outra.
O conjunto das obras completas de Jung consta, na edição inglêsa, de 18 volumes afora numerosos seminários mimeografados, pertencentes ao Instituto C. G. Jung de Zurique.
A partir de 1933 correram boatos de que Jung teria simpatia pelo nazismo. Sejam examinados os fatos. Em 1930 (antes de Hitler assumir o poder) Jung fôra eleito vice-presidente da Sociedade Médica Internacional de Psicoterapia, com sede em Berlim. O presidente da Sociedade era E. Kretschmer. Quando Hitler tomou o poder, E. Kretschmer deixou a presidência e os membros da Sociedade, compreensivelmente alarmados, dada a situação da Alemanha, pediram insistentemente a Jung que aceitasse a presidência. Sua autoridade científica e sua condição de suiço representavam verdadeira táboa de salvação. “Deveria eu, perguntou Jung a seus acusadores, na atitude de neutro prudente retirar-me para a segurança do lado de cá da fronteira e lavar as mãos em inocência, ou deveria – segundo estava bem consciente – arriscar minha pele e expor-me a inevitáveis malentendidos, aos quais não poderia escapar todo aquele que, por força de premente necessidade, tivesse de entrar em contato com os poderes políticos existentes na Alemanha?” Jung decidiu correr os riscos que previra. Sob a presidência de Jung, a Sociedade Médica Internacional de Psicoterapia conseguiu realizar dois congressos fora da Alemanha: um em Copenhague (1937) e outro em Oxford (1938). Decerto esses encontros, noutros países, representaram verdadeiros respiradouros para muitos cientistas alemães.
Jung interpretou o nacional socialismo como fenômeno patológico. Uma irrupção do inconsciente coletivo. “Wotan” havia tomado posse da alma do povo alemão. E quem é Wotan? É o deus pagão dos germânicos, “um deus das tempestades e da efervescência, desencadeia paxões e apetites combativos”. Num ensaio publicado em 1936, Jung traça o paralelo entre Wotan redivivo e o fenômeno nazista. Wotan é uma personificação de forças psíquicas – corresponde a “uma qualidade, um caráter fundamental da alma alemã, um ‘fator’ psíquico de natureza irracional, um ciclone que anula e varre para longe a zona calma onde reina a cultura”. Os fatores econômicos e políticos pareceram a Jung insuficientes para explicar todos os espantosos fenômenos que estavam ocorrendo na Alemanha. Wotan reativado no fundo do inconsciente, Wotan invasor, seria explicação mais pertinente. E estávamos apenas em 1936!
O argumento decisivo é, porém, a atitude dos nazistas em ralação a Jung. Com o aparecimento do livro PSICOLOGIA E RELIGIÃO, 1940, as autoridades decidiram que oda a sua obra fosse interditada e queimada na Alemanha, bem como nos países ocupados por Hitler.
Outra acusação correlata com a de simpatizante do nazismo, foi a de antisemita. Seria desde logo estranho admitir que um psicólogo, toda sua vida em busca do fundo psíquico comum a todos os homens (inconsciente coletivo), eternamente existente sob as diferentes peculiaridades individuais, locais, naionais, raciais, históricas, fosse partidário de discrinações entre esses mesmos homens cuja alma tinha paraele igual estrutura básica. Seria também estravagante que um antisemita contasse entre seus iscípulos mais próximos precisamente homens de origem semita. Basta lembrar alguns nomes. Erich Neumann, judeu alemão, Chefiava o grupo jungueano em Tel Aviv, Israel, onde morreu em 1960. Seus livros são originais aplicações da psicologia jungueana. AS ORIGENS E A HISTÓRIA DA CONSCIÊNCIA, sua obra principal, é prefaciada por Jung. Gerhard Adler, judeu alemão, refugiado do nazismo, um dos mais destacados elementos do grupo jungueano na Inglaterra, co-editor das obras completas de Jung. Adler define esses ataques a jung como devidos a “completa ignorância ou, pior, a maldade intencional”. Roland Cahen, fracez de origem semita, é quem chefia a escola jungueana na França e dirige a publicação das obras de Jung em lingua francesa.
Fossem as acusações resultantes de um malentendido, sem raízes emocionais, teriam sido logo liquidadas de modo definitivo, face a tantas documentações e testemunhos logicamente irrefutáveis. Entretanto, a peristência desses rumores bem indica que por traz deles fermentam ainda as divergências entre Jung e o grande judeu Freud, nunca perdoadas pelos discípulos do mestre ortodoxo.
Jung possuia uma casa de campo em Bolligen (S. Gall), bem rente ao lago. Começou a construção em 1923. Era de início uma ampla estrutura circular, de dois andares, espécie de torre. Depois foi acrescentada uma parte central e, anexa a esta, outra torre mais estreita. Anos mais tarde um pátio descendo até o lago veio prolongar a casa e, em 1955, um andar superior foi adicionado à parte central. Somente então, narra Jung nas suas MEMÓRIAS, ele se apercebeu que essas diferentes partes, construídas com vários anos de permeio, constituíam um conjunto significativo, um símbolo da totalidade psíquica. A ampla torre, com a sua lareira, representava “o maternal”, a segunda torre, onde ninguém entrava sem sua permissão, lugar de retiro e de meditação – representava “o espiritual”. O pátio era a abertura para natureza e finalmente, o andar levantado por último, sobre a parte central, representava o ego, significando a extensão da consciência atingida na velhice. Assim, a casa de Bellingen era “a representação em pedra dos meus mais íntimos pensamentos e dos conhecimentos que eu tinha adquirido”.
Na casa de Bollingen “não fiz instalar eletricidade, e eu mesmo tomo conta da lareira e da estufa. À noite acendo velhas lâmpadas. Lá não existe água corrente e tiro água do poço com a bomba. Corto a lenha e cozinho os elementos. Estes atos simples tornam o homem simples; e como é difícil ser simples!” Ainda em Bollingen, Jung trabalhava sobre pedra, esculpindo ou cinzelando inscrições e pintava murais inspirados nas suas imagens interiores. Este lugar era realmente o habitat ideal para o Velho Sábio. De modo algum foi Jung um melancólico que fugisse do mundo. Sua jovialidade era conhecida e comentava-se a riqueza da gama de seus risos, que ia desde o sutil sorriso do intelectual requintado à vasta gargalhadade um camponês sadio. Estava sempre pronto a relacionar-se com outra pessoa – discípulo, amigo ou mesmo visitante estrangeiro. “Não quero libertar-me nem dos seres humanos, nem de mim mesmo, nem da natureza, porque tudo isso apresenta-se para mim como o maior dos milagres”.
Cada ano Jung prolongava por mais tempo suas estadias em Bollingen. Na primavera de 1961 não chegou a ir para lá. E na tarde de 6 de junho morreu tranquilamente.
Pode-se aplicar a Jung aquilo que ele próprio disse referindo-se a Paracelso:”E do mesmo modo que ele apanhava em torno de si, sem nenhum preconceito, a matéria prima para sua experiência exterior, ia buscar também nas trevas primitivas de sua alma as idéias filosóficas fundamentais de sua obra”.
O texto acima foi extraido do livro JUNG – VIDA E OBRA (Autora Nise da Silveira), edição de 1968.